Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
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2.3. O governo do Estado da Índia
Por aquela época, Martim Afonso de Sousa apresentava-se como um candidato incontestável ao cargo de governador, tomando em linha de conta o bom desempenho que evidenciara na qualidade de capitão-mor do mar da Índia, o contacto privilegiado que mantinha com D. João III e D. António de
350
Cf. supra nota Parte II, nota nº 346. 351
«Ora me dyzem que vem Dom Garcya, ora que fulano ou cycrano, he non hahy sofrymento que abaste a isto» - cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, costa do Malabar, 18-I-1538, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J.,, pp. 31-32. 352
Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a Fernão Álvares de Andrade, Goa, 15-XI-1538, pub. in Ibidem, p. 33. 353 Cf. Ásia, V, v, 5 e Lendas, vol. IV, p. 69. 354 Cf. Martim Afonso de Sousa, «Brevíssima e Sumária Relação...», p. 75. 355 Cf. supra Parte II, nota nº 349. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
220 Ataíde e até a recomendação expressa, senão entusiástica, que dele faziam outros oficiais do Estado da Índia 356 . Em Janeiro de 1541, quando um correio terrestre se apresentou na corte portuguesa, em Almeirim, com o propósito de anunciar a morte do vice-rei e a subida ao poder de D. Estevão da Gama, já o monarca tinha resolvido designar Martim Afonso como sucessor de D. Garcia. Assim, as notícias recebidas apenas determinaram a antecipação da data prevista para a sua partida 357
. Em contrapartida, a atracção sentida pelo fidalgo em relação àquelas funções esmorecera bastante . O foco das suas ambições ter-se-ía então deslocado do topo do funcionalismo português na Ásia para um título nobiliárquico, para um cargo de referência dentro do Reino ou, no mínimo, para um senhorio jurisdicional. A dedução colhe apoio num avivamento de memória praticado por Martim Afonso de Sousa em relação à rainha D. Catarina, em 1557, no âmbito do qual lhe escreveu «na era de quarenta e um me mandou Sua Alteza à Índia por governador, sem lhe eu nunca nisso falar, como Vossa Alteza deve ser bem lembrada, antes requeria coisa muito diferente» 358 . A
ambiguidade da linguagem não consente uma definição segura da natureza do objectivo , mas é de meditar que, em 1534, Martim Afonso aludira ao galardão de que todos os companheiros de juventude de D. João III haviam sido alvo, ao passo que ele continuava expectante 359 . Ora, do antigo círculo de íntimos do monarca faziam parte D. Luís da Silveira e D. António de Ataíde, os quais tinham sido contemplados, respectivamente, com os lugares de guarda-mor e de vedor da Fazenda e com os condados da Castanheira e de Sortelha. Convem recordar, a propósito, que Martim Afonso justificara a troca do serviço da Casa de Bragança pelo da Casa Real, exactamente, com base na
356 Sustentava D. João de Castro que «Martim Afonso é homem muito suficiente para governar a India, porque tem muitas qualidades que se requerem para o governo desta terra. Lembre-se V. A. de o homrar e lhe fazer mercê, porque o tem ele mui bem servido.» - cf. carta a D. João III, Goa, 1539 (?), pub. in Obras, vol. III, 25. Diogo Pereira concedia-lhe um apoio tão forte que o chegava a sugerir para uma nomeação de carácter vitalício, «pelas calidades que tem, e medo que lhe cá hão e esperiência que dele temos visto» - cf. carta a D. João III, Bendurte, 25.I.1539, pub. por Luís Filipe F. R. Thomaz, «O “Testamento Político” de Diogo Pereira...», p. 154. 357
Cf. Assento do Conselho Real, Almeirim, 22-I-1544 [sic], pub. in Relações de Pêro de Alcáçova Carneiro..., pp. 405-406. 358
Cf. Martim Afonso de Sousa, «Brevíssima e Sumária Relação...», p. 71. 359
Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, ao largo da costa da Guiné, 12.IV.1534, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J., p. 8. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
221 prerrogativa régia de criar títulos 360
. Se em termos realistas lhe era interdito almejar um ducado, não se afigurava tão desproprositado sonhar com um condado, na mesma proporção que, a partir dos inícios da década de 1550, D. António se permitiu cobiçar um marquesado 361 . Havia apenas duas premissas, de forçosa observação, a separar a aspiração da realidade, isto é, a posse de um senhorio e a anuência do rei. O equilíbrio entre linhagens perseguido por D. João III, incompatível com a atribuição de um segundo título aos Sousas Chichorro, após a instituição do condado do Prado, e a atitude geral de parcimónia que o soberano revelou no fomento do grupo aristocrático acabaram por frustrar os planos dos dois primos 362
. No que concerne a Martim Afonso de Sousa, a relativa insatisfação em que o deixou a escolha do seu nome para o comando do Estado da Índia talvez tenha estimulado a Coroa a estabelecer alguns mecanismos compensatórios. Esquadrinhando as mercês de que o fidalgo foi objecto desde que se reinstalara em Portugal até à formalização do despacho, duas parecem obedecer a este critério. Uma, comportando vantagens para a subsistência futura da sua prole e encerrando relevante carga simbólica, consistiu no privilégio de indigitar um dos filhos varões para suceder à mãe, D. Ana Pimentel, no benefício de uma tença anual de 103.280 reais e de seguir-se ao pai no usufruto da comenda de S. Tiago de Beja, possuída por Martim Afonso junto com o hábito da Ordem de Cristo, na condição habitual de que o eleito viesse a servir dois anos em Marrocos 363
. A outra, francamente aliciante numa perspectiva material, concedeu a Martim Afonso de Sousa o quinto das presas que fossem tomadas no decurso do seu mandato como governador do Estado da Índia
364 .
360 Veja-se supra Parte I, nota nº 404. 361 Cf. Copia..., p. 15. 362 Jean Aubin, «La Noblesse...», in Le Latin..., vol. I, pp. 371-383. 363 Cf. alvará régio, Almeirim, 24.I.1541, inserto em alvará régio outorgado a Martim Afonso de Sousa (neto), Lisboa, 16.III.1571, in IANTT, Ch. de D. Sebastião, l. 36, fls. 246v-247v. 364
A benesse foi-lhe atribuída por D. João III, sem que se saibam os termos exactos, nem o local e a data de emissão do respectivo documento. A referência explícita à existência e à natureza da provisão constam de um alvará outorgado por D. Sebastião a Martim Afonso de Sousa, emitido em Almeirim, a 25 de Janeiro de 1565, isentando-o do pagamento de 5.000 cruzados pela compra da vila do Prado à Coroa, o qual se encontra inserto na carta de doação da mesma vila ao fidalgo, Lisboa, 16.III.1566, in IANTT, Ch. de D. Sebastião, l. 19, fl. 56. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
222 O referido quinhão constituía um direito realengo, adaptado da prática de divisão de espólios de guerra instituída durante a Reconquista e inspirado na jurisprudência islâmica 365
. Prerrogativas semelhantes haviam sido dispensadas pela Coroa ao almirante Manuel Pessanha, em 1317, e aos infantes D. Henrique e D. Pedro, em 1433, mas não se apuram precedentes desta matéria no historial anterior da presença portuguesa na Ásia. A partir dos meados de Quinhentos e, pelo menos, até aos primórdios da década de 1610, a distinção passou a ser conferida a outros governantes do Estado da Índia, embora sem carácter continuado. Confirmou-se, pois, a natureza especial e extraordinária da graça, inteiramente dependente do arbítrio do soberano e excluída do rol de próis e percalços, cuja fruição era, por norma, reconhecida àqueles 366
. A insistência feita por D. João III na figura de Martim Afonso de Sousa para conduzir os destinos do Estado da Índia decorreu em moldes inéditos e lesivos, quer dos interesses quer da reputação, da Casa da Vidigueira. Enquanto, em Dezembro de 1524, D. Henrique de Meneses fora o primeiro oficial a aceder ao posto de governador por determinação inscrita numa via de sucessão e, por vontade expressa do Piedoso, teria tido oportunidade de completar o mandato, bem como de ser reconduzido, se a morte não o tivesse surpreendido antes 367
, D. Estevão estava condenado a ser um governador de curto prazo, impedido de exercer funções até ao fim do prazo normal de três anos 368
. À conta da situação descrita, veio a ser travada uma luta de facções no meio palatino, com activa participação dos chefes das casas titulares aparentados com os fidalgos em disputa pela direcção do Estado da Índia. A causa de D. Estevão encontrou um defensor natural na pessoa do irmão D. Francisco da Gama, 2º conde da Vidigueira, aderindo também a ela o vedor da Fazenda e 1º conde do Vimioso, D. Francisco de Portugal 369 . Não
obstante se reclamasse «segundo coyrmão e servydor e amigo de Martim
365 Alcorão, VIII: 1 e 41. 366 Cf. Alexandra Pelúcia, Corso e Pirataria – Presas Portuguesas no Golfo de Bengala (1516- 1666), Lisboa, FCSH-UNL, 1998, disertação de mestrado policopiada, pp. 44-46. 367
Cf. João Paulo Oliveira e Costa, «A Estrutura...», in D. João III e o Império..., eds. Roberto Carneiro & Artur Teodoro de Matos, p. 313. 368 Aparentemente, o filho de D. Vasco da Gama terá intuído ser aquele o seu destino, tentando contrariá-lo mediante o estabelecimento de contactos com o Reino, os quais resultaram frustrados – Cf. Frei Luís de Sousa, Anais..., vol. II, p. 105. 369 Cf. Assento do Conselho Real, Almeirim, 22-I-1544 [sic], pub. in Relações de Pêro de Alcáçova Carneiro..., p. 406 e Ásia, V, viii, 1. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
223 Afonso», além de convicto das qualidades do primo, D. Francisco expôs um conjunto de razões abonatórias do prosseguimento da comissão de serviço do Gama 370
. No seu juízo, haveria a contemplar a rectidão de carácter que levara D. Estevão a clarificar a sua situação financeira no momento da tomada de posse; a expedição militar ao Mar Vermelho que estava em curso à data, sob comando do próprio, visando pela primeira vez o afrontamento das forças otomanas dentro de um espaço geo-estratégico que lhes era vital 371
; o facto de ele ter sido investido em funções havia menos de um ano, de forma absolutamente legítima; e, por último, a sua filiação ao descobridor da Índia, o qual se dispusera a voltar ao Oriente em 1524, depois de velho, honrado e abastado, numa atitude de sacrífício que acabara por lhe custar a vida. Pretendia D. Francisco que a questão fosse resolvida em observância de princípios éticos elementares, baseados no entendimento de que «a verdadeira justiça dos reis he não envergonharem seus vasalos e fazerem nos todos muy amigos». Em coerência com este ponto de vista, a sua declaração de apoio afigurar-se-ia independente das personalidades enredadas na celeuma e teria mesmo sido decidida em prol de Martim Afonso de Sousa caso fosse ele quem estivesse em risco de ser afastado do posto, em igualdade de circunstâncias. O conde do Vimioso aduzia a existência de outros benefícios no atraso da partida do primo até ao término do mandato de D. Estevão da Gama, os quais se relacionavam com a melhor preparação da viagem, a certeza de se evitar um desencontro entre os dois oficiais (possível de se registar estando ainda a decorrer a expedição ao Mar Vermelho) e a vantagem de se receberem, entretanto, dados actualizados acerca do panorama político-militar asiático, com certeza úteis à concepção de um plano de governo. A pertinência dos argumentos aduzidos à discussão pelo mais antigo vedor da Fazenda de D. João III não impede que se lhe possam surpreender motivações suplementares, porventura de índole mais taxativa e pragmática, no suporte dispensado aos Gamas. Neste contexto, é pertinente começar por sublinhar que a única filha por ele gerada, D. Guiomar de Vilhena fora unida em
370
Cf. carta de D. Francisco de Portugal a D. António de Ataíde, s.l., s.d. [1541], pub. in CSL, vol. I, pp. 153-158. 371 Veja-se Elaine Sanceau, «Uma Narrativa da Expedição Portuguesa de 1541 ao Mar Roxo», in Stvdia, nº 9, Lisboa, CEHU, 1962, pp. 199-234. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
224 matrimónio ao 2º conde da Vidigueira 372
, ajudando a forjar uma aliança que extravasava, naturalmente, da esfera familiar para a pública 373 . Acrescia, como pano de fundo, a rivalidade que separava D. Francisco de outro primo e vedor, D. António de Ataíde, desde que este se vira confirmado como principal colaborador do rei, provocando a visível diminuição da influência do primeiro 374
. As divergências entre os dois vedores tinham origem numa convivência pessoal tensa e desconfiada, mas seriam as posições políticas e ideológicas assumidas individualmente a conferir-lhes maior projecção. É muito provável que D. Francisco e D. António se tenham encontrado desalinhados, nos inícios da década de 1540, face ao rumo a conferir à presença portuguesa no Norte de África. Motivo de preocupação para D. João III desde os útimos anos de 1520, em consequência do isolamento das praças sob somínio português na região, das dificuldades em lhes providenciar abastecimentos e das crescentes ameaças muçulmanas, em conjugação com o aumento dos encargos suportados pela Fazenda Real na organização e na dilatação dos restantes espaços do Império, o abandono de alguns estabelecimentos estava então a ser equacionada de novo. A reflexão colectiva estava a ser particularmente estimulada pelo assédio conduzido pelos Saadidas contra Santa Cruz do Cabo de Gué, o qual culminou na derrota portuguesa, em Março de 1541, e arrastou as saídas voluntárias de Safim e de Azamor, em Outubro do mesmo ano 375
. Os pareceres emitidos pelo conde da Castanheira aconselharam sempre o recuo em Marrocos e a concentração de meios na Índia, em função das expectativas de prestígio e de proveito inerentes à intervenção em cada uma
372
Veja-se o Anexo Genealógico nº VI. 373
Em 1539, D. Estevão da Gama deixou a capitania de Malaca e seguiu para a Índia, contando embarcar depois com destino a Portugal. Consta que terá mudado de ideias após ter recebido aviso escrito, da parte de D. Francisco de Portugal, de que lá se deveria manter caso Martim Afonso de Sousa alimentasse propósitos de viagem. Seria o sinal de que D. Estevão estava em condições de vir a tomar conta do governo do Estado da Índia e de que o conde do Vimioso estava empenhado em ajudá-lo – cf. Ásia, V, vi, 7. 374 Poucos anos depois, o conde do Vimioso endereçou ao monarca um memorial dos múltiplos e antigos serviços que prestara à Coroa. Na sua opinião, D. Manuel I tinha sido exímio no reconhecimento e na remuneração dos mesmos, numa atitude profundamente contrastante com a negligência a que o votou o sucessor – cf. carta de D. Francisco de Portugal a D. João III, s.l. [Évora], s.d. [1544], pub. por Valeria Tocco, in Poesias e Sentenças..., pp. 25-35 375 Cf. Maria Leonor Garcia da Cruz, «As Controvérsias ao Tempo de D. João III sobre a Política Portuguesa no norte de África», in Mare Liberum, nº 13, Lisboa, CNCDP, 1997, pp. 123-187. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
225 das áreas geo-políticas 376
. O sentido concreto da opinião do conde do Vimioso permanece desconhecido, embora haja indícios para supor que seria propenso à salvaguarda das praças marroquinas. Além de ter pelejado em Arzila e em Azamor, durante o reinado de D. Manuel I 377 , e de ter manifestado vontade, junto de D. João III, para atender em exclusivo as petições dos veteranos de Marrocos
378 , é incontroversa a atenção dedicada por D. Francisco de Portugal às problemáticas daquela região, nos momentos de crise vividos nos primórdios da década de 1540 379 .
substituição de D. Estevão da Gama por Martim Afonso de Sousa adquiria contornos abrangentes, que passariam pela vivificação da sua relação especial com os Gamas, a par da tentativa de fragilizar o conde da Castanheira e as respectivas opções políticas. As esperanças de D. Francisco goraram-se, todavia. Martim Afonso foi alvo da solidariedade empenhada de D. António de Ataíde, explicando Diogo do Couto ter sido este a levar o conflito de vencida pela prosaica razão de «que então mandava tudo» 380
. Os bons ofícios do conde da Castanheira foram, decerto, aplicados na matéria. Em conjugação com a enorme influência que lhe era habitualmente creditada, tal circunstância terá induzido a que as ressonâncias da pendência chegassem à Índia de forma algo simplificada e distorcida. A verdade é que D. João III estava persuadido da inteira legitimidade que lhe assisitia para proceder à nomeação de um novo governador sempre que fosse avisado do
376 Cf. Ibidem, pp. 180, 185; Maria Paula Coelho de Carvalho, A Acção..., p. 170; e carta de D. António de Ataíde a D. João III, s.l., s.d., pub. por Frei Luís de Sousa, in Anais..., vol. II, pp. 314-317. 377 Veja-se supra Parte II, nota nº 25 378 Cf. Ditos..., nº 278, p. 113. 379 Segundo o esboço biográfico traçado por Valeria Tocco, D. Francisco assumiu, «a partir de 1541, o papel de intermediário entre os informadores de Marrocos ao serviço de Portugal e do Rei, participando deste modo na consecução da aliança entre Lisboa e Fez. Remontam a este período, com efeito, algumas cartas em que o conde de Vimioso é apontado como interlocutor de Jacob Rute – escriba em língua árabe, nomeado por D. João III em 1523 “intérprete de Safia” – e de Sebastião de Vargas, agente do Rei na missão na corte de Fez» – cf. «D. Francisco de Portugal...», in Poesias e Sentenças..., p. 16. Os índices da colecção documental do Corpo Cronológico conservam inclusive o registo de uma carta enviada pelo conde a D. João III, a partir do Norte de África, descrevendo «o estado em que achara a cidade de Ceuta, que sempre mandara vigiar, sem embargo das pazes feitas com el-rei de Fez, e que Muley Mafamede estava ainda levantado e mais poderoso do que nunca», Ceuta, 13.I.1541, in IANTT, CC, I-69-44 [sic: o sumário não corresponde ao documento conservado sob a referida cota]. 380 Cf. Ásia, V, viii, 1. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
226 óbito de outro, ido de Lisboa. Entendia o monarca que as cartas de sucessão eram meros instrumentos destinados a evitar vazios de poder decorrentes dos grandes lapsos temporais que mediavam a troca de informações entre a Índia e o Reino. Dando seguimento a esta linha interpretativa, qualquer designação que implicasse a destituição de D. Estevão da Gama estaria revestida de cobertura legal, a de Martim Afonso de Sousa por razão acrescida, visto ter sido planeada a título de substituição directa de D. Garcia de Noronha, ainda antes de ter havido conhecimento em Portugal da morte do último 381 .
Índia por intermédio de uma carta de sucessão, ou pelo menos o direito a que a Coroa se reservava de julgar a continuidade ou a interrupção de uma comissão de serviço granjeada daquela forma, vingaria segunda vez no reinado de D. João III. É o que se depreende do facto de o monarca ter nomeado D. Afonso de Noronha vice-rei, em 1550, implicando o desalojamento de Garcia de Sá do palácio de Goa, que ali rendera o falecido D. João de Castro, em meados de 1548 382
. Pese embora Garcia de Sá ter vindo igualmente a morrer, sempre houve lugar à destituição de outro fidalgo promovido por conta das vias de sucessão, a saber, Jorge Cabral 383
. O entendimento produzido pelo rei a respeito de Francisco Barreto revelou-se de índole diferente, uma vez que lhe foi permitido manter-se no cargo que vagara graças ao passamento de D. Pedro de Mascarenhas, em 1555 384 .
Numa atitude de consideração pessoal relativamente ao conde da Vidigueira, D. João III acabou, todavia, por delegar no Conselho Real a responsabilidade da solução definitiva do diferendo político espoletado em 1541. Tomaram assento em reunião ad hoc os infantes D. Luís e D. Henrique, este acumulando o estatuto de membro da família real com a ostentação do Download 3.56 Mb. Do'stlaringiz bilan baham: |
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