Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas


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sido descrito pelo capitão de Goa como um elemento muito turbulento, assim justificando a voz 

de prisão recebida, e de Martim Afonso de Sousa estar investido do poder necessário para 

destituir oficiais em situações pertinentes  - cf. «Verdadeira  Enfformaçam...», s.l., s.d. , pub. in 

GTT, vol. III, p. 200; carta de D. Garcia de Castro a D. João III, 3.XII.1543, pub. in  «Cartas de 

“Serviços”...», ed. Luís de Albuquerque & José Pereira da Costa, pp. 345 -346; Lendas,  vol. IV, 

p. 306; e carta de mercê do governo da Índia, Almeirim, 12.III.1541, in IANTT, Ch. de D. João 

III, l. 31, fl. 42v.   

475


 Vejam-se carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Cochim, 23.XII.1542, pub. in 

DHMPPO-I, vol. II, pp. 309-310; carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Goa, 

1.XII.1543, in IANTT, CC, I-74-29; carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Chaul, 

18.XII.1544, in IANTT, CC, I-75-116; carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, 

Goa, 23.XII.1544 [sic], pub. por  Frei Luís de Sousa, in  Anais..., vol. II, pp. 270-272, e carta de 

Martim Afonso de Sousa a D. João III, Goa, 19.I.1545, pub. in GTT, vol. IX, pp. 187-188.    



Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

246 



A amostra não estimula ilações terminantes a respeito do papel 

estratégico que o clientelismo desempenhou ao longo do percurso de Martim 

Afonso de Sousa. É certo que ali constam recomendações à atenção régia e 

elogios a catorze fidalgos, que se distinguiam por uma longa folha de 

serviços

476


 ou pela oferta de mesas a soldados

477


. O estilo geral adoptado 

nesses trechos é, todavia, pouco apaixonado, sugerindo uma motivação 

anódina da parte do governador em relação a algo que ultrapassasse o simples 

reconhecimento dos bons préstimos rendidos e a justa integração dos 

respectivos obreiros no sistema redistributivo orquestrado pela Coroa. De 

qualquer forma,  é de salientar a existência,  entre os encomendados, de dois 

familiares, Belchior de Sousa Chichorro e Pantaleão de Sá, e de sete oficiais 

que secundaram Martim Afonso durante o cumprimento do mandato  

governativo

478


Entre o restante correio expedido a partir do Estado da Índia, a busca de 

indícios de relações clientelares conectadas a Martim Afonso de Sousa resulta 

baldada, com excepção daquele  que teve origem no Pe. Francisco Xavier.  O 

patrocínio dispensado  por D. João III à Companhia de Jesus e, sobretudo,  os 

meses de convivência passados a bordo da  Santiago, culminando  na doença 

do fidalgo, favoreceram a ligação de ambos

479


. Após se ter instalado em Goa

Xavier recebeu o apoio institucional e material que se afigurava útil à instituição 

                                                 

476


 Francisco de Sousa fora um dos capitães da armada de 1541 e iniciara a torna-viagem nos 

finais de 1542 ou nos inícios do ano seguinte. A favor dele era aduzida uma experiência de 

vinte anos na Índia, os elevados gastos efectuados e uma suposta falta de habilidade pessoal 

para procurar mercês – cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Cochim, 23.XII.1542, 

pub. in DHMPPO-I, vol. II, p. 310.  

António de Lemos era apoiado na pretensão à capitania de Cochim, em razão de prolongados 

serviços rendidos à Coroa, em Marrocos e no Oriente, e da perda de quatro irmãos nas lides 

ultramarinas – cf. carta  de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Goa, 1.XII.1543, in IANTT, 

CC, I-74-29, fl. 1. 

477


 António Moniz, António da Silveira, Belchior de Sousa Chichorro, Bernardim de Sousa, D. 

Fernando de Noronha Fernão da Silva, Gaspar de Melo, D. João de Almeida, João  de 

Mendonça, Jorge da Silva, Manuel de Mesquita e Pantaleão de Sá – cf. carta de Martim Afonso 

de Sousa a D. João III, Chaul, 18.XII.1544, in IANTT, CC, I-75-116, fls. 6v-7. 

478

 António da Silveira, capitão de um galeão da armada do governador - cta. de Martim Afonso 



de Sousa ao rei, Chaul, 18-12-1544, in IANTT, CC, I-75-116, fl. 6v.  

Bernardim de Sousa, Fernão da Silva e João de Mendonça, capitães da armada que atacou 

Baticalá, em 1542, e da expedição ao pagode, em 1543 – cf.  Ásia, V, ix, 1 e V, ix, 7; Lendas

vol. IV, pp. 297, 307; e  História, IX, xxxi. O último já secundara Martim Afonso de Sousa na 

batalha de Beadala-Vedalai – cf. João de BarrosÁsia, IV, viii, 13 e História, VIII, clxxiiii. 

D. Fernando de Noronha e D. João de Almeida, capitães da «Viagem do Pagode» – cf. Lendas

vol. IV, p. 307. 

Sobre Francisco de Sousa veja-se supra Parte II, nota nº 476. 

479

 Cf. carta do Pe. Francisco Xavier aos membros da Companhia de Jesus, Goa, 20.IX.1542, 



pub. in DHMPPO-I, vol. III, pp. 27-28. 

Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

247 



de um colégio jesuíta e à promoção de actividades evangelizadoras. O 

Apóstolo da Ásia sentia em Martim Afonso um empenho sem límites, que mais 

o cativava por vir acompanhado de mostras de fervor religioso e de disposição 

para a defesa militar das bolsas cristãs em formação no Sul da Índia. Era, pois, 

expectável que  as  comunicações despachadas para Roma lhe  fizessem o 

panegírico

480

. Aquelas que tinham por destinatário o fundador e primeiro geral 



da Companhia, Inácio de Loyola,  reflectiam  adicionalmente  um sentido de 

obrigação mutualista

481

. Xavier tratou de lhe dar vazão, sensibilizando Loyola 



para que  se correspondesse, em tom laudatório, com aquele protector da 

Companhia e para que instigasse o sumo pontífice a adoptar igual 

procedimento

482


. Martim Afonso também percebeu que o poder que controlava 

e o contacto directo com o missionário lhe poderiam trazer vantagens 

espirituais, pelo que se  socorreu dele como intercessor na angariação de 

indulgências papais, em benefício pessoal e da sua família nuclear

483

.  


A falta de narrativas epistolares,  que  tragam a lume  o raio de alcance 

social e o nome de outros membros da rede clientelar  articulada pelo  

governador, determina a valorização da «Verdadeira Enfformaçam das Cousas 

da Índia» enquanto fonte primária de informação. Na verdade,  a análise das 

informações ali detalhadas reserva conclusões sugestivas, a merecerem 

                                                 

480

 Cf. carta do Pe. Francisco Xavier ao Pe. Inácio de Loyola, Goa, 20.IX.1542, pub. in Ibidem



vol. III, pp. 35-40; carta do Pe. Francisco Xavier ao Pe. Inácio de Loyola, Tutucorim, 28.X.1542, 

pub. in Ibidem, vol. III, pp. 51-53; carta do Pe. Francisco Xavier aos membros da Companhia de 

Jesus em Roma, Cochim, 15.I.1544, pub. in  Ibidem, vol. III, p. 62; e carta do Pe. Francisco 

Xavier aos membros da Companhia de Jesus em Roma, Cochim, 27.I.1545, pub. in Ibidem, vol. 

III, pp. 146-147. 

481


 «Y si de mi parte pensasse que ay necessidad de rogaros que no olvidéys déll en vuestros 

devotos sacrificios, encomendároslo  ya como a mi ánima propria, por serle yo tanto en 

obligación. Obligóme a ser tanto suyo su virtud, y también por él ser mio»  - cf.  carta do Pe. 

Francisco Xavier ao Pe. Inácio de Loyola, Goa, 20.IX.1542, pub. in DHMPPO-I, vol. III, p. 35. 

482

  Cf. carta do Pe. Francisco Xavier ao Pe.  Inácio de Loyola, Tutucorim, 28.X.1542, pub. in 



Ibidem, vol. III, pp. 52-53. 

483


  «El Señor Governador, a lo que creo, os escrive; y aunque nos os conosce de vista, es 

mucho vuestro devoto y de todos los de la Compagnía; no dexéis de escriverle y mandarle un 

par de rosarios de cuentas, unas para su muger y otras para éll, con todas las gracias, 

indulgencias, que de Su Santidad pudiéredes alcançar: alas mucho de estimar, ansí por las 

gracias, indulgencias, que Su Santidad le ha de conceder, como por embiárrselas vos. Más os 

pide el Señor Governador, que por la mucha confiança que en vos tiene, que le alcanséys esta 

gracia y privilegio de Su Santidad, que todas las vezes que se confessare éll y su muger, hijos 

e hijas, que le conceda Su Santidad aquellas indulgencias que ganarían si todas las siete 

yglesias de Roma en persona visitassen. En esto recibirá el Señor Governador gran charidad 

de vos, y pensaría de mí que algún crédito tengo con vos, si por escriviros yo de su parte 

alcançáredes de Su Santidad estas gracias y las otras.» - carta do Pe. Francisco Xavier ao Pe. 

Inácio de Loyola, Goa, 20.IX.1542, pub. in Ibidem, vol. III, p. 40. 



Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

248 



atenção por se perfilarem em coerência com aquelas já avançadas ao longo 

deste capítulo e do anterior. 

Integradas num projecto de denúncia global da conduta de Martim 

Afonso de Sousa, as acusações lançadas de favorecimento pessoal começam 

por enfatizar a circunstância de «a letra andar em Sas e Sousas e não serem 

alembrados outros»

484

. Assim, a animosidade do autor anónimo seria 



despertada menos pela prática de nepotismo verificada do que pela exclusão 

dos representantes de outras linhagens em relação à partilha de benesses e 

pelo inerente rompimento de delicados equilíbrios nobiliárquicos. 

Em rigor, o patrocínio do governador não se restringia à sua parentela. O 

libelo revela um rol de trinta criaturas tidas como afectas a ele e tocadas com a 

sua liberalidade

485

. Deste universo, apenas oito, constituindo pouco mais do 



que um quarto do total, era composto por consaguíneos, à razão de cinco 

maternos e de três paternos

486

, justificando-se a preponderância dos Sás pela 



rarefacção de Sousas Chichorro na Ásia marítima, atrás aludida. Outros oito 

correspondiam a oficiais cuja presença regular junto de Martim Afonso de 

Sousa remontava ao período do exercício da capitania-mor do mar da Índia, 

metade dos quais já então tinham concitado o seu empenho intercessor

487



Também da década de 1530 datava o conhecimento com Miguel Ferreira,  lider 



da comunidade portuguesa da costa do Coromandel, que foi alçado à 

                                                 

484

 Cf. «Verdadeira Enfformaçam...», s.l., s.d. , pub. in GTT, vol. III, p. 201. 



485

 Veja-se o Anexo de Quadros Sinópticos nº VI.  

486

  Da linha paterna eram eles Afonso Henriques de Sepúlveda, Belchior e Aleixo de Sousa 



Chichorro. Este era responsabilizado por vários excessos, não se lhe apontando, exactamente, 

privilégios com origem na munificência de Martim Afonso. Mas, como aos outros dois foram 

concedidas viagens à China e é sabido que Aleixo de Sousa encaminhou para o mesmo 

destino um junco, além de ter tido assento na vedoria da Fazenda, afigura-se pertinente anexá-

lo à lista de favorecidos do governador. Sobre a viagem do referido junco vejam-se o «Auto 

levantado a Aleixo de Sousa, por negocear em pimenta quando era vedor da fazenda», Goa, 

19.X.1545, pub. por Luís de Albuquerque, in «Aleixo de Sousa...», pp. 196-197 e carta de 

Salvador de Leão a D. João de Castro, Cochim, 19.I.1546, pub. in CSL, vol. II, p. 217. 

Afectos à linha materna estavam Garcia de Sá, cumulado com a capitania de Malaca e com o 

arrendamento do trato de Banda através de um contrato de valor subavaliado; Pantaleão de Sá 

e Cristóvão de Sá, galardoados com dotações em numerário; e Francisco de Sá, obsequiado 

com viagens comerciais (neste caso resulta difícil precisar se se tratava de Francisco de Sá, o 



dos Óculos, filho de Artur de Sá, ou de Francisco de Sá e Meneses, filho de João Rodrigues de 

Sá e Meneses, visto ambos assistirem na Índia àquele tempo). Por último, há a considerar 

António de Sá, o  Rume, primo mais afastado, igualmente trineto de João Rodrigues de Sá, o 

das Galés, brindado com duas viagens à China. Vejam-se o Anexo Genealógico nº VII e, para 

resenhas das respectivas carreiras, João Paulo Oliveira e Costa (coord. e redacção),  Os 



Primeiros Sás..., pp. 88-91, 102-103, 105-108, 127-129. 

487


 A saber, D. Diogo de Almeida Freire, Fernão de Sousa de Távora, Martim Correia da Silva e 

Miguel de Ayala. Veja-se o Anexo de Quadros Sinópticos nº V. 



Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

249 



respectiva capitania, em detrimento da opção feita por D. Estevão da Gama

488


certamente porque aquele comungava de algumas das concepções político-

militares que Martim Afonso dedicava àquela região e ao envolvente Mar de 

Ceilão


489

. Um sub -grupo de cinco indivíduos, em que falta a identificação 

nominal de três, estava-lhe directamente vinculado por obrigações de 

assistência doméstica (dois vedores, um camareiro e um criado) ou 

institucional (o secretário António Cardoso, designado pela Coroa em 1541

490


). 

Um fidalgo, D. Fernando de Noronha, era primo coirmão de D. Pedro de 

Meneses, o extinto 3º marquês de Vila Real e fiel protector de Martim 

Afonso


491

. Outro, o galego Diogo Soares de Melo, aparece referenciado por 

Diogo do Couto como amigo «muito grande» de Martim Afonso

492


. No que 

concerne às seis personagens remanescentes não se descortinam nexos 

especiais de ligação ao governador, embora seja de realçar que entre eles se 

incluía o Dr. Pêro Fernandes, ouvidor-geral do Estado da Índia, cuja boa 

disposição poderia estar associada a algumas mais valias. 

As solidariedades pessoais exercitadas por Martim Afonso de Sousa 

repousavam, portanto, numa impressionante maioria de 80% das situações 

escrutinadas, em vínculos de natureza sólida e duradoura, fossem derivados 

da rede de parentesco em que o próprio se inseria; das convivências nascidas 

e aprofundadas ao abrigo da carreira das armas; dos serviços devotados à 

casa senhorial do fidalgo e ao despacho burocrático por ele presidido; ou de 

proximidades construídas ao sabor de circunstâncias várias. A base de suporte 

de muitas destas ligações é averiguada através do cruzamento de dados 

                                                 

488

  Cf.  carta de Gabriel de Ataíde a D. João III, Goa, 15.X.1545, pub. in «Cartas de 



“Serviços”...», ed. Luís de Albuquerque & José Pereira da Costa, p. 357. 

489


 Cf. Jorge Manuel Flores, «Um “Homem que Tem Muito Crédito Naquelas Partes”: Miguel 

Ferreira, os “Alevantados” do Coromandel e o Estado da Índia», in  Mare Liberum, nº 5, Lisboa, 

CNCDP, 1993, p. 25. 

490


 Cf. Luís Filipe F. R. Th omaz, «A Questão da Pimenta em Meados do Século XVI», in  

Carreira da Índia..., ed. Artur Teodoro de Matos & Luís Filipe F. R. Thomaz, p. 162, n. 423. 

Chamado a depôr no âmbito de um processo de inquérito, solicitado por Martim Afonso de 

Sousa e ordenado  por D. João de Castro, António Cardoso não teve pejo em se declarar 

«muito serujdor e amjgo do sopricante e que com todo dizia a verdade»  - cf. «Cópia 

autenticada dos depoimentos feitos sobre o dinheiro que Martim Afonso de Sousa recebe de 

Coge Samacedim», Goa, 12.XII.1545, pub. in Obras, vol. IV, p. 13.  

491

 Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Chaul, 18.XII.1544, in IANTT, CC, I-75-



116, fl. 7.  

492


 Cf.  Ásia, V, viii, 2, dando ideia de que a ligação era anterior à segunda vinda de Martim 

Afonso de Sousa para a Índia. De qualquer forma, a relação de proximidade desenvolvida a 

partir do encontro de ambos  na costa oriental africana justificaria, por si só, a aplicação do 

rótulo de amizade – veja-se supra Parte II, notas nº 425 e 471.  



Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

250 



biográficos fornecidos por uma pluralidade de fontes documentais, e não com 

base exclusiva nas declarações contidas na «Verdadeira Enfformaçam...», 

aspecto que importa frisar para reconhecer verosimilhança mínima à 

generalidade das conexões clientelares ali apontadas.  

O leque de benesses a que Martim Afonso podia lançar mão, em 

proveito dos seus principais apaniguados, era contudo restrito. A queixa 

formulada por Nuno da Cunha a D. João III, no ano de 1537, de que nenhuns 

recursos lhe sobravam para galardoar, de mote próprio, os oficiais do Estado 

da Índia, em consequência do hábito adquirido pelo rei de assentar as 

nomeações para os cargos de relevo e de lhes prever a sucessão por prazos 

de tempo dilatados

493


, mantinha actualidade na primeira metade da década de 

1540. Como já é sabido, foram escassos os provimentos sobre os quais o 

governador teve oportunidade de deliberar, uns devidos a inesperadas lacunas 

registadas, outros implicando substituições forçadas, mas legitimadas pelas 

prerrogativas de que dispunha. Os de Aleixo e de Belchior de Sousa Chichorro 

escaparam à argúcia do autor anónimo, ao contrário daqueles relativos a 

Garcia de Sá, Miguel Ferreira e Jerónimo de Figueiredo, respectivamente  

designados para as capitanias da fortaleza de Malaca, da costa do Coromandel 

e da expedição à Ilha do Ouro

494


. Aparentemente, haveria maior liberdade na 

distribuição das funções eminentemente burocráticas, de que eram exemplo 

feitorias, corretorias de mercadorias, escrivaninhas de naus e posições na 

alfâ ndega de Malaca, as quais eram desdenhadas pela nobreza de estirpe, 

mas podiam alimentar a clientela menos exigente do governador, a começar 

pelos dependentes da sua casa senhorial

495



As alternativas exploradas por Martim Afonso de Sousa, em termos de 



favorecimento dos fidalgos que lhe eram chegados, consistiam na oferta de 

somas em dinheiro

496

 ou de artigos vendáveis  (matéria em que terá violado 



                                                 

493


 Cf. Andreia Martins de Carvalho, Nuno da Cunha..., p. 126.  

494


  Cf. «Verdadeira  Enfformaçam...», s.l., s.d., pub. in GTT, vol. III, pp. 200-201 e 206. 

Referente a Jerónimo de Figueiredo parece esclarecedor que tenha sido convocado para 

substituir Diogo Cabral depois de ter ganho experiência, entre 1536 e 1538, como capitão da 

armada de Martim Afonso de Sousa e de se ter manifestado como opositor ao governador D. 

Estevão da Gama, com ânimo suficiente para expedir, da Índia para Moçambique, uma 

denúncia escrita dirigida ao  novo governador – cf. João de Barros, Ásia, IV, vii, 21 e IV, viii, 13; 



História, VIII, cxlvi e VIII, clxxiiii; e Lendas, vol. II, pp. 775, 828 e vol. IV, p. 226. 

495


 Cf. Ibidem, pp. 209-210. 

496


 Cf. Ibidem, pp. 217-218. 

Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II 

 

251 



alguns  princípios  reguladores  do  sistema de monopólios régios

497


)  e, 

sobretudo, na concessão de viagens comerciais

498

.  Concebida como um 



instrumento de recompensa nobiliárquica que empenhava recursos pontuais do 

Estado, essencialmente meios navais e manutenção do pagamento de soldos, 

a alienação dos direitos de exploração de circuitos mercantis inter-asiáticos 

fora, originalmente, implementada por D. Manuel I, tornando-se mais freque nte 

a partir da década de 1530, acabando por conhecer plena vulgarização na 

segunda metade do século XVI

499

. A maturação de que o modelo ainda era 



alvo durante o governo de  Martim Afonso e a variedade de portos que se 

espraiavam a leste do Cabo Comorim, em áreas sujeitas a controlo superficial 

por parte da estrutura oficial portuguesa, ter-lhe-ão facultado o  espaço de 

manobra necessário para proceder a  tais doações sem grande perigo de 

colisão com  mercês régias. A «Verdadeira Enfformaçam...» divulga  a 

concessão de uma dezena de viagens com escala ou termo em vários pontos 

do Golfo de Bengala e de oito viagens à China, contra uma única a desenrolar-

se, estritamente, dentro do perímetro do Mar Arábico, com destino a Ormuz. 

A sensibilidade comercial de Martim Afonso de Sousa merece ênfase no 

tocante  à valorização  dos contactos com o litoral chinês. Esta vinha na senda 

de objectivos análogos, traçados pelo próprio D. João III, mas que não 

                                                 

497

 Cf. Ibidem, pp. 201 e 203. Observando critérios de importância comercial e estratégica, a 



Coroa portuguesa definira, em 1505, um conjunto de produtos cujo livre tráfico passou a estar 

vedado aos agentes escalados para o serviço oriental. O segmento do oficialato, bem como 

figuras da aristocracia, que não chegavam a dirigir-se aos domínios asiáticos, gozavam de 

autorização régia para dinamizarem negócios particulares com base em quantidades limitadas 

daqueles produtos, especiarias incluídas. Neste contexto, os excessos de Martim Afonso de 

Sousa prender-se-iam mais ao volume dos artigos cedidos do que à natureza das mesmas, 

como se infere da menção aos «muitos bares de mercadoryas defesas». Sobre estas 

problemáticas sigo os textos de Luís Filipe F. R. Thomaz, «Os Portugueses nos Mares da 

Insulíndia no Século XVI», in  De Ceuta a Timor, pp. 570-571 e «A Questão da Pimenta...», in 

Carreira da Índia..., ed. Artur Teodoro de Matos & Luís Filipe F. R. Thomaz, pp. 104-105. D. 

João de Castro corroborou a situação, esclarecendo que «Martim Afonso, vendo a pobreza e a 

necessidade dos fidalgos e outras pessoas, parecendolhe que doutra maneira os não podia 

remedear, fazialhe merce em nome de V. A. de lhe dar licença que podessem tratar em bares 

de gengiure, canela e crauo, e achei isto de maneira que não sey agora dizer se ouue ca algum 


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