Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas


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1.3. As alianças matrimoniais 

As estratégias nobiliárquicas de consolidação e ampliação de poder 

estavam longe de se restringir  à definição de símbolos específicos, à 

constituição de núcleos patrimoniais e ao serviço da Coroa. Pesasse embora 

uma acentuada feição agnática no tocante à organização interna e às regras 

de sucessão, as estruturas linhagísticas  jamais se poderiam  alhear  da 

importância dos contributos femininos, com origem externa ao grupo, para a 

sua própria subsistência e afirmação

422


. Se importava garantir a reprodução 

da estirpe, convinha também não descurar as vantagens políticas e sociais, 

bem como os proveitos materiais, aos quais seria possível aceder por via da 

análise ponderada dos recursos próprios disponíveis,  das  alternativas 

oferecidas a cada momento pelo mercado matrimonial  e da efectiva 

concertação de alianças de parentesco com grupos influentes. 

O casamento assumia foros de  centralidade  nas preocupações  do 

círculo  da nobreza, visto isentar a honra em relação a quaisquer máculas de 

nascimento e proporcionar ganhos bastante objectivos e apetecíveis, que iam 

desde o dote  importado pelas noivas até à protecção e  à intercessão de 

favores que os parentes maternos e por afinidade  dispensavam amiúde. 

Nesse sentido, o conjunto de decisões envolventes de uma união nupcial não 

configurava um assunto cuja resolução pudesse ser abandonada à 

prevalência do discernimento ou  dos afectos  dos nubentes. Era matéria que 

exigia a participação colectiva e uma avaliação de interesses de ordem plural, 

                                                 

422

 Cf. Isabel Beceiro Pita & Ricardo Córdoba de la Llave, Parentesco..., p. 76 e José Enrique 



Ruiz-Domènec, El Gran Capitán..., p. 78.   

Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 111 


 

que  tendiam a  prevalecer em detrimento de  meros desejos e opiniões 

pessoais

423


.  

Os Sousas Chichorro não constituíram excepção à regra. Parte 

apreciável do protagonismo que conquistaram ao longo do tempo ter-se-á 

ficado a dever a essa capacidade de promover relações úteis, de associação 

e de consaguinidade, com outras linhagens. Tenha -se presente, desde logo, 

o recebimento de D. Inês Dias Manuel por  Vasco Martins de Sousa, que se 

revelou fundamental para a modelação da identidade da progénie de ambos, 

através da legitimidade alcançada para incorporar prestigiadas  insígnias 

heráldicas de matriz cognática

424


Doravante, os Sousas Chichorro perderam a capacidade de se ligarem 

a  personalidades próximas da realeza, mas não a de continuar a valorizar, 

explicitamente, os laços matrimoniais firmados. De maneira mais frequente, 

achavam-se refle xos disso na prática de denominar membros da linhagem, 

em geral filhas ou varões secundogénitos, com apelidos de origem 

materna

425


. Sem pretensão de fornecer  dados exaustivos  a respeito, podem 

ser evocados os exemplos de D. Violante  Lopes de Távora, filha do 

reposteiro-mor de D. João I, Pedro Lourenço de Távora, e mulher do vedor 

das obras reais de Trás-os-Montes, Martim Afonso de Sousa, cujo 

sobrenome foi incorporado pelo neto D.  Martinho,  gerado por Rui  de 

Sousa


426

, tendo ainda baptizado uma neta quase homónima, filha de Pêro de 

Sousa

427


; de D.  Brites da Silveira, filha do alcaide-mor de Torres Novas, 

Gomes de Miranda, e esposa de Garcia de Sousa Chichorro, que transmitiu o 

apelido à filha D. Mécia

428


; bem como de D. Branca de Ataíde, filha de João 

                                                 

423

 Cf., por exemplo, Michel Nassiet, Parenté…, pp. 104-110;  Isabel Beceiro Pita & Ricardo 



Córdoba de la Llave, Parentesco..., p. 147; Rudolf Braun, «Staying on Top...», p. 247; Rosa 

Maria Montero Tejada, Nobleza..., pp. 59-64; Mafalda Soares da Cunha,  A Casa de 



Bragança..., pp. 470-471;  e Francisco Marcos Burgos Esteban,  Los Lazos del Poder. 

Obligaciones y Parentesco en una Elite Local Castellana en los Siglos XVI y XVII

Valhadolide, Universidad de Valladolid, 1994, pp. 115-117  

424

 Veja-se supra capítulo 1.1. 



425

 Esta era uma tendência de observância generalizada em Portugal, a par de outros 

domínios europeus  – Cf.  Isabel Beceiro Pita & Ricardo Córdoba de la Llave, Parentesco...

pp. 83-84 e 104. 

426

 Veja-se o Anexo Genealógico nº I e III. 



427

 Veja-se o Anexo Genealógico nº VII. 

428

 Veja-se o Anexo Genealógico nº IV. 



Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

112 



 

de Ataíde, senhor de Penacova,  e consorte de João de Sousa, que também 

legou o apelido à filha D. Maria

429


A panóplia de sobrenomes evocada sugere a realização de uma 

aposta prioritária em enlaces conjugais exogâmicos, tendente à ampliação do 

universo de relações da linhagem e, por consequência, dos benefícios 

inerentes. Esta correspondeu, de facto,  a uma estratégia  de aplicação 

recorrente ao longo do século XV. Enquanto, no último quartel de Trezentos, 

Martim Afonso de Sousao da Batalha Real, fora personagem principal, junto 

com D. Maria de Briteiros, de uma  ligação marcada pela consanguinidade e 

de carácter espúrio

430


, o varão de ambos, Gonçalo Anes, foi levado a uma 

primeira união com D. Filipa de Ataíde,  assumindo  o  filho homónimo do 

primeiro e da abadessa de Rio Tinto a incumbência de casar com D. Violante 

Lopes de Távora. Como nota comum   e, muito provavelmente , indutora do 

interesse dos Sousas Chichorro, regista-se a estreita conexão existente entre 

alguns  parentes  próximos das noivas e  certos departamentos áulicos. D. 

Filipa era filha da aia dos infantes da  Ínclita Geração, D. Mécia Vasques 

Coutinho, e irmã do governador da casa do infante D.  Pedro,  Álvaro 

Gonçalves de Ataíde, o qual seria distinguido como 1º conde de Atougia, em 

1448


431

. Por seu lado, como já acima foi dada indicação, D. Violante era filha 

do reposteiro-mor do fundador da dinastia de Avis

432


.  

Aproximação semelhante foi promovida com recurso  ao casamento 

entre Martim Afonso de Melo, o  Velho, guarda-mor  de D. João I, e D. 

Briolanja de Sousa, irmã de Gonçalo e meia-irmã de Martim Afonso

433



Décadas depois, os Melos voltaram a perfilar-se como aliados desejáveis, a 



ponto de Rui de Sousa desposar D. Branca de Vilhena, filha de Martim 

Afonso de Melo,  o Moço, guarda-mor de D. Duarte e de D. Afonso V, e irmã 

de D. Rodrigo de Melo, 1º conde de Olivença (1476-1487)

434


. Acrescentando 

                                                 

429

 Veja-se o Anexo Genealógico nº V. 



430

 Veja-se supra pp. 46-47 e Luiz de Mello Vaz de São Payo, «A Família...», tomo VII, 1966, 

pp. 146-153. 

431


 Cf. Brasões, vol. I, pp. 80-84 e Humberto Baquero MorenoA Batalha..., vol. II, pp. 720-

726. 


432

 Cf. Humberto Baquero Moreno, Ibidem, pp. 975 e 979. 

433

 Cf. Luiz de Mello Vaz de São Payo, «A Família...», tomo VII, 1966, pp. 198-199. 



434

 Cf. Brasões, vol. I, p. 214 e Nobiliário, vol. X, pp. 541-542. Para ajuizar da import ância 

deste grupo no Portugal quatrocentista veja-se João Paulo Oliveira e Costa, «O Conde de 

Tentúgal e a Linhagem dos Melos na Política Ultramarina Manuelina», in  A Alta Nobreza...

ed. João Paulo Oliveira e Costa & Vítor Luís Gaspar Rodrigues, pp. 12-16. 


Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 113 


 

informação de que as primeiras núpcias de Rui de Sousa o tinham  vinculado 

a D. Isabel de Sequeira, filha de Francisco Anes da Torre, vedor da Casa da 

rainha D. Isabel

435

; que o irmão primogénito, Fernão de Sousa,  recebera a 



mão de D. Mécia de Castro, filha do 1º conde de Atouguia

436


; e que o irmão 

mais novo, João de Sousa cruzou o seu destino com o de D. Branca de 

Ataíde, filha de João de Ataíd e, senhor de Penacova e camareiro-mor do 

infante D. Pedro

437

,  fica  denunciada uma inequívoca  disposição para 



estabelecer e aproveitar parentescos no seio do aparelho governativo e 

cortesão. 

Os restantes filhos de Martim Afonso de Sousa e D. Violante Lopes de 

Távora não tiveram oportunidade de consumar enlaces tão significativos do 

ponto de vista sócio-político, mas importa realçar que nenhum deles se viu 

confinado ao celibato

438

, nesta particularidade radicando o desdobramento 



dos Sousas Chichorro à cabeça de várias casas senhoriais. Significa isto que 

havia meios suficientes para conferir estado a todos os rebentos. Desta sorte, 

Vasco Martins de Sousa Chichorro subiu duas vezes ao altar, sempre 

acompanhado por mulheres desprovidas  de grandes pergaminhos

439



Situações  deveras interessantes estiveram, no entanto, associadas a D. 



Brites e a Pêro de Sousa, pelo que se impõe dedicar-lhes atenção especial. 

D. Brites de Sousa, lembre-se, estivera  vinculada por fortes laços 

afectivos ao herdeiro do ducado de Bragança e 1º marquês de Valença, cuja 

morte precoce inviabilizou a legitimação do  suposto matrimónio de ambos  e 

do nascimento do filho D. Afonso

440


.  Em face da delicadeza do problema, 

presume-se o incómodo sentido, em termos públicos, pelos Sousas Chichorro 

e, de  maneira mais  acutilante, perante os lídimos Braganças. Impunha -se 

uma solução rápida e consensual,  facilmente  acessível a partir da própria 

                                                 

435


 Cf. Brasões, vol. I, p. 214.  

436


  Cf. carta de confirmação de casamento, Santarém, 12.III.1451, in IANTT,  Ch. de D. 

Afonso V, l. 11, fl. 8. 

437


 Cf. Brasões, vol. I, pp. 227, 229; Nobiliário, vol. I, p. 510 e vol. X, p. 570. 

438


 Elevados índices de nupcialidade traduziam, por norma, posições sociais avantajadas, 

valendo o inverso para as altas taxas de celibato familiar – cf. Isabel Beceiro Pita & Ricardo 

Córdoba de la Llave, Parentesco..., pp. 161-170 e Mafalda Soares da Cunha, Linhagem..., p. 

28.   


439

 Foram elas Violante Nunes e D. Isabel Osório, a última sendo reputada como uma nobre 

castelhana. Ignoram-se quaisquer outros elementos a respeito delas, incluindo a respectiva 

filiação – cf. Nobiliário, vol. X, pp. 558-559. 

440

 Veja-se supra capítulo 1.2. 



Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

114 



 

linhagem  e do accionamento dos dispositivos de solidariedade interna.  Foi, 

assim, alinhavado o enlace de D. Brites com o primo coirmão Fernão de 

Sousa Camelo

441

. O noivo experimentava as suas terceiras núpcias e já tinha 



assegurado descendência, além de que gozava de uma condição sócio-

económica estável, garantida pelo senhorio da terra de Roças.  Nada o 

desaconselharia, portanto, a recusar a união. Pelo contrário, a aceitação da 

endogamia pareceria, a todos os títulos, motivadora para quem, como ele e o 

irmão Luís Álvares de Sousa, senhor de Baião, ensaiava a plena integração 

entre os Sousas Chichorro. Na verdade, sendo ambos va rões nascidos a 

Álvaro Gonçalves Camelo e a D. Inês de Sousa, filha de Martim Afonso de 

Sousa,  o da Batalha Real

442

, tinham incorporado o apelido materno como 



sinal de distinção social, sendo de realçar que a denominação do primogénito 

Luís excluía mesmo  qualquer  referência agnática que não fosse o 

patronímico. 

A sugerir que a endogamia  era, prioritariamente, concebida  por esta 

linhagem, e pela generalidade da  alta nobreza , como uma medida utilitária 

esteve um novo casamento, celebrado na recta final  do terceiro quartel de 

Quatrocentos.  Estiveram então implicados Manuel de Sousa, único  varão de 

João de Sousa, capitão dos ginetes do infante D. Fernando

443

, e D. Joana de 



Sousa,  declarada como  sucessora no senhorio de Baião

444


, apesar da 

existência de  um meio-irmão nascido do segundo matrimónio paterno

445

. O 


eventual consórcio da dama com um fidalgo estranho à estirpe tinha boas 

probabilidades de equivaler à diluição do património entre os bens de outra 

linhagem.  Poderia até ter sido  ponderado o perigo de perda ou de 

                                                 

441

 Cf. HGCRP, vol. XII-parte II, p. 11 e  Nobiliário, vol. X, p. 536. Veja-se o Anexo 



Genealógico nº XIV. 

442


 Cf. Brasões, vol. I, p. 235; Nobiliário, vol. III, p. 240 e vol. X, p. 370; e Luiz de Mello Vaz de 

São Payo, «A Família...», tomo VII, 1966, pp. 197-198.   

443

 Manuel de Sousa desapareceu em vida do pai, após ter gerado vários filhos, tendo sido 



referido como morto durante a campanha bélica conduzida por D. Afonso V em solo 

castelhano  – cf. carta de mercê a João de Sousa, Toro, 11.V.1476, in IANTT,  Ch. de D. 



Afonso V, l. 43, fls. 27v-28. Veja-se o Anexo Genealógico nº V. 

444


 Veja-se o Anexo Genealógico nº XIV. 

445


 Tratava-se de Fernão Martins de Sousa, cujo filho Cristóvão de Sousa instaurou um 

processo judicial contra o primo João de Sousa de Lima, disputando o senhorio de Baião, 

que fora confirmado ao segundo por D. Manuel I e D. João III. Certamente por prevalência 

dos direitos de varonia em linha recta, João de Sousa de Lima acabou por perder a causa, 

havendo lugar à transferência da tutela para o herdeiro de Cristóvão, outro Fernão Martins de 

Sousa, que se tornou o 8º senhor de Baião  – cf. Brasões, vol. I, p. 230; Nobiliário, vol. X, pp. 

570 e 667.    


Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 115 


 

subalternização do nome de família tomado pelos ascendentes de D. Joana. 

Não deixa, por isso, de resultar algo irónico o baptismo do primogénito do 

casal como João de Sousa de Lima, sem dúvida, reflectindo a importância de 

D. Leonel de Lima, 1º visconde Vila Nova de Cerveira (1475-1495), e de D. 

João de Lima, 2º visconde (1495-1508), respectivamente, pai e irmão da mãe 

da senhora de Baião, D. Isabel da Silva

446


Seja como for, neste caso, tal como no de D. Brites de Sousa, 

descortina-se a existência de um nexo explicativo , bem mais evidente do que 

qualquer outro que tenha estado subjacente à relação endogâmica, 

igualmente,  firmada entre D. Violante de Távora, filha de Pêro de Sousa, e 

Rui de Sousa Cide, neto, por via bastarda, de Gonçalo Anes de Sousa

447



Pêro de  Sousa, foi atrás antecipado, é outra personagem a merecer 



análise atenta, não em função de um consórcio efectivado dentro do colectivo 

familiar, mas sim da permeabilidade demonstrada em relação à acção de 

interferências externas no campo das opções matrimoniais.  Na qualidade de 

terciogénito, desprovido de predicados para atrair uma união  de alto nível, e 

de servidor da Casa de Bragança, que o podia aproveitar numa estratégia de 

reforço dos laços de vassalagem

448

, o fidalgo contraiu casamento com D. 



Maria Pinheira, filha do Dr. Pedro Esteves Cogominho, desembargador e 

ouvidor-geral das terras do ducado

449



A instrumentalização das bodas dos  Sousas Chichorro em prol dos 



interesses bragantinos teve continuação nos finais do século XV, conhecendo 

novos actores em D. Jaime e Lopo de Sousa. Durante um significativo lapso 

de tempo, o acompanhamento do duque teria inibido o aio de tomar esposa. 

Ora, o fim do exílio e a reintegração na sociedade portuguesa não só 

permitiram como estimularam a alteração desse estado de coisas. 

Em 1483, o alcaide-mor do Porto, João Rodrigues de Sá, havia sido 

um dos contemplados por D. João II na redistribuição dos haveres 

confiscados à Casa de Bragança, cabendo-lhe em sorte os senhorios de 

                                                 

446


 Veja-se o Anexo Genealógico nº XIII. 

447


 Veja-se o Anexo Genealógico nº XIV. 

448


 Sobre as motivações dos grandes senhores para se imiscuírem nas opções matrimoniais 

dos seus dependentes veja-se Isabel  Beceiro Pita & Ricardo Córdoba de la Llave, 



Parentesco..., pp. 139-140.  

449


 Cf. Linhagens, p. 33 e  Nobiliário, vol. X, p. 553. 

Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

116 



 

Paiva e de Baltar

450

. A partir de 1496, com o processo de reconstituição do 



ducado em marcha, João Rodrigues manifestou-se como um sério 

perturbador da nova ordem gizada por D. Manuel I, resistindo a abdicar das 

ditas terras. Se, por aqueles anos, Lopo de Sousa assumiu um compromisso 

conjugal com D. Brites de Albuquerque, filha do terceiro casamento do 

alcaide-mor do Porto, dando azo ao nascimento de uma primeira criança, 

Martim Afonso de Sousa,  no ano de 1500, é pertinente supor que a resolução 

tenha ocorrido num quadro de esforço bilateral de alívio de tensões e de 

resolução de rivalidades

451

, fossem as de origem recente, entre Sás e 



Braganças, ou outras mais antigas,  que tinham indisposto Sás em relação a 

Sousas Chichorro

452



João Rodrigues de Sá deu, ainda assim, mostras de proverbial 



teimosia, recusando a proposta régia de usufruto pessoal de uma tença 

indemnizatória de 120.000 reais anuais e a atribuição de outra a ser auferida

por um  filho , após a sua morte, no valor de metade daquela. No Verão de 

1499,  enquanto o impasse não era ultrapassado,  o monarca achou por bem 

conceder ao duque de Bragança o proveito imediato da primeira e reservar 

para Lopo de Sousa, já então genro do indócil alcaide, o lucro da segunda, a 

partir do momento  em que as jurisdições em causa fossem devolvidas

453


. Na 

dúvida de como e quando se superou o pleito , fica a certeza de que foi Lopo 

de Sousa quem passou a tutelar, em primeira instância, Paiva e Baltar

454


 e a 

suspeita de que o feliz parto de D. Brites poderá ter contribuído, em decisivo, 

para o facto, animando o avô materno a engrossar o futuro estado do recém-

nascido. 

Martim Afonso de Sousa representava, no fundo, um fruto do Portugal 

manuelino em vias de reconciliação interna.  A mesma ideia podia aplicar-se 

ao primo coirmão D. António de Ataíde,  igualmente  nascido em 1500, da 

                                                 

450

 Cf. Humbero Baquero Moreno, A Batalha..., vol. II, p. 943.  



451

 Cf. Isabel Beceiro Pita & Ricardo Córdoba de la Llave, Parentesco..., p. 146 e  Rosa Maria 

Montero Tejada, Nobleza…, p. 63. 

452


 Ficara guardada a memória do profundo agastamento sentido por João Rodrigues de Sá, 

o das Galés, face à relação pública e adulterina mantida entre a irmã, D. Aldonça Rodrigues 

de Sá, abadessa de Rio Tinto, e Martim Afonso de Sousa, o da Batalha Real – cf. Brasões, 

vol. I, p. 208 e Luiz de Mello Vaz de São Payo, «A Família...», tomo VI, 1965, p. 367   

453


 Cf. carta de merc ê a Lopo de Sousa, Lisboa, 27.VIII.1499, in IANTT, Leitura Nova  – 

Místicos, l. 4, fls. 88-88v. e carta de tença ao duque de Bragança, Lisboa, 27.VIII.1499, in 

IANTT, Ch. de D. Manuel I, l. 41, fl. 108v.  

454

 Veja-se supra Parte I, nota nº 128.  



Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 117 


 

ligação  recente entre uma filha e irmã de exilados, D. Violante de Távora, e 

outro dos fidalgos proscritos pelo Príncipe Perfeito,  o adiantado em idade D. 

Álvaro de Ataíde

455

. Se bem que a aliança entre Sousas Chichorro e Ataídes 



remontasse aos primórdios de Quatocentos e tivesse sido renovada  nos 

meados da centúria

456

, o último enlace fora, inequivocamente,  impulsionado 



pelos elos de solidariedade forjados durante o período de expatriação e pelo 

desanuviamento decorrente da reinstalação no Reino. 

 Dotada de uma base menos sólida, a conexão aos Sás não deixou de 

ser cultivada, nos inícios de Quinhentos, com recurso à tradicional solução de 

recolha de nomes agregados à nova linhagem aliada. Os filhos sobrevindos a 

Lopo de Sousa foram alvo de uma escolha criteriosa de denominações, que 

enfatizou, nos casos do primogénito e do secundogénito, Pêro Lopes de 

Sousa, a respectiva filiação agnática, dando margem à  corporização  de 

tributos de âmbito cognático por parte da restante prole .  Deste modo, D. 

Isabel e D. Catarina foram nomeadas de Albuquerque em função da mãe, D. 

Brites, e o terceiro varão foi baptizado como João Rodrigues de Sousa em 

atenção ao avô materno

457



João Rodrigues de Sá era, para todos os efeitos, um nome que 



inspirava  enorme respeito em  Portugal, desde o período de instituição da 

dinastia de Avis. Quem, originalmente, se afirmara  com ele fora o trisavô de 

Martim Afonso de Sousa, também conhecido pelo cognome de o das Galés

Apoiante de D. João I e dispensador de apreciados serviços, o fidalgo foi 

elevado às categorias de camareiro-mor do rei e alcaide-mor do Porto, nas 


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