Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas


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1.2. A influência política e cortesã 

Do que atrás ficou exposto, ganha contornos claros a ideia de que uma 

linhagem correspondia a uma realidade em contínua construção e renovação, 

entendendo-se esta não apenas no sentido mais óbvio e natural, o da 

procriação e sucessão biológica, mas também no plano político-social. 

Ambas as esferas mereciam especial cuidado e atenção. Se a primeira, sob 

observância de determinadas  condições prévias, era crucial para a 

sobrevivência física da estirpe

150

 e, por arrastamento, do nome e das 



insígnias associadas, a segunda exigia um protagonismo relativamente 

constante, sob pena de diminuição da visibilidade pública e, por conseguinte, 

                                                 

148


 Veja-se supra p. 54. 

149


 Veja-se supra p. 41 e infra capítulo 3.1. 

150


 Sobre as opções matrimoniais e reprodutivas nobiliárquicas, em geral, e as dos Sousas 

Chichorro, em particular, vejam-se os capítulos 1.3. e 3.2.   



Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

58 



 

da  honra e do proveito que  deviam assistir, de forma regular, se não 

crescente, à generalidade dos membros do grupo.  

A nobreza de linhagem movimentava-se, preferencial e 

estrategicamente, num mundo de iguais. Acima deste, tutelando-o, 

arbitrando-o e esforçando-se por o controlar, estava a figura cimeira do rei, 

investido e reconhecido na dignidade de  primus inter pares. Cabeça e 

coração da sociedade, de acordo com os princípios corporativos vigentes no 

sistema político europeu da Baixa Idade Média e da Idade Moderna Inicial, o 

soberano era coadjuvado nas funções de conduzir e de zelar pela 

subsistência e prosperidade da res publica pelos restantes órgãos e membros 

do corpo social, com evidente destaque para aqueles que gozavam de um 

estatuto superior natural

151


. Era o caso inequívoco da nobreza e, 

particularmente, dos escalões superiores do grupo.    

Não obstante o desequilibro de preeminência que cavava o fosso entre 

o rei e a nobreza, a constante interacção que pautava a relação entre ambos, 

assumindo uma efectiva dimensão mutualista, estimulou o desenvolvimento 

da corte enquanto espaço aglutinador de interesses e de convivência a todos 

os níveis. Justamente, na esteira do esforço pioneiro conduzido por Norbert 

Elias


152

, o meio cortesão tem-se constituído como privilegiado objecto de 

estudo historiográfico, mormente, no quadro da estruturação dos modernos 

estados europeus, de cariz tendencialmente centralizado e burocratizado

153

.  


                                                 

151


 Veja-se supra Parte I, nota nº 10. 

152


 Veja-se Norbert Elias, A Sociedade de Corte, Lisboa, Editorial Estampa, 1995 (ed. original 

em 1969). 

153

 Entre a plêiade de contributos disponíveis sobre a matéria, sigo sobretudo aqueles 



formulados por Philippe Contamine, «L’État et les Aristocraties», in  L’État et les Aristocraties 

XIIe-XVIIe Siècle – France, Angleterre, Ecosse, ed. Ph. Contamine, Paris, Presses de l’École 

Normale Supérieure, 1989, pp. 11-26; Peter Burke, «O Cortesão», in  O Homem 



Renascentista, dir. Eugenio Garin, Lisboa, Editorial Presença, 1991, pp. 99-119; Ronald G. 

Asch, «Introduction: Court and Household from the Fifteenth to the Seventeenth Centuries», 

in  Princes, Patronage and the Nobility. The Court at the Beginning of the Modern Age c. 

1450-1650, eds.  Ronald G. Asch & Adolf M. Birke, Oxford, The German Historical Institute 

London & Oxford  University Press, 1991, pp. 1-38; José Martínez Millán, «Introducción...», in 



Instituciones y Elites de Poder..., ed. J. M. Millán, pp. 11-24; Antoni Maczak, «The Nobility-

State Relationship», in  Power Elites..., dir. Wolfgang Reinhard, pp. 189 -206; José Martínez 

Millán (dir.), La Corte de Carlos V, 5 vols., Madrid, Sociedad Estatal para la Conmemoración 

de los Centenarios de Felipe II y Carlos V, 2000; Antonio Álvarez-Ossorio Alvariño, «El Arte 

de Medrar en la Corte: Rey, Nobleza y el Código de Honor», in  Familia..., eds.  Francisco 

Chacón Jiménez & Juan Hernández Franco, pp. 39-60; e Álvaro Fernández de Córdoba 

Mirales,  La Corte.... Entre nós a temática não se encontra tão aprofundada, mas são de 

destacar os trabalhos de Miguel Jasmins Rodrigues, «As Monarquias...», pp. 537-560; Idem 

& Luís Filipe Oliveira, «Um Processo...», pp. 77-114; Mafalda Soares da Cunha, «A 


Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

  59 


 

Do século XV em diante, as cortes reais europeias superiorizaram-se, 

em definitivo, face às congéneres e rivais de índole senhorial

154


. Albergando 

em simultâneo a Casa Real e as instituições de cúpula do Estado, a corte 

passou a configurar um centro nevrálgico ou, citando a opinião abalizada de 

José Martínez Millán, «una sede privilegiada del  proceso de la toma de 

decisiones y de la regulación de los equilibrios sociales, sino también como 

centro de elaboración de comportamientos, de una ideologia y de un 

simbolismo que constituye la esencia del poder.  En este sentido, la corte se 

revela como el lugar por excelencia en el que “se hace política”.»

155



Perspectivada sob ângulo diverso, a corte afirmou-se ainda como um 



meio social específico, o mais saliente e influente de todos, dotado de uma 

forte cultura própria, codificada em termos vivenciais e relacionais, no seio do 

qual pontificava a figura-tipo do cortesão, passível de desdobramento em 

múltiplas facetas, desde o modelo de civilidade ao favorito, passando pelo 

funcionário. 

A nobreza que, imemorialmente, tinha servido de braço armado da 

Coroa,  quando não alimentava tendências centrífugas e revoltas abertas 

contra a autoridade da mesma, passou a acumular funções de serviço régio 

nos departamentos áulicos e burocráticos, não deixando de aceder ali à 

honra e ao proveito caros à ordem. Em boa verdade, a fixação na corte 

representava uma moeda de dupla face, pois, se a proximidade do rei e dos 

agentes susceptíveis de o influenciarem auspiciavam a captação dos 

respectivos favores e a promoção nobiliárquica, em contrapartida, havia que 

aceitar como regra intrínseca do jogo, ao menos teoricamente, o respeito pela 

disciplina interna, a vinculação da fidelidade pessoal à Casa Real e à política 

implementada pela Coroa. O mesmo é dizer que a monarquia era uma parte 

                                                                                                                                            

Nobreza...», pp. 219-252; e Rita Costa Gomes,  A Corte... e «A Curialização...», in  



Tempo..., dir. Diogo Ramada Curto, pp. 179-187. 

154


 No caso português, foi precisamente por aquela altura que as cortes senhoriais 

começaram a ganhar maior expressão numérica e influência política. O processo, contudo, 

nunca escapou à apertada fiscalização da Coroa, a qual se socorreu de diversos 

mecanismos de salvaguarda da sua superioridade  – cf. Mafalda Soares da Cunha, 

«Nobreza, Rivalidade e Clientelismo na Primeira Metade do Século XVI. Algumas 

Reflexões», in  Penélope, nº 29, Oeiras, Celta Editora, 2003, pp. 34-35 e João Cordeiro 

Pereira, «A Estrutura...», in  Nova História de Portugal, dir. Joel Serrão e A. H. de Oliveira 

Marques, vol. V, coord. João José Alves Dias, pp. 315-322. 

155

 Cf. José Martínez Millán, «La Historiografia sobre Carlos V», in  La Corte…, dir.  J. M. 



Millán, vol. I, Corte y Gobierno, coord. J. M. Millán & Carlos Javier de Carlos Morales, p. 37.  

Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

60 



 

deveras interessada no fortalecimento do espaço e dos mecanismos 

cortesãos. Beneficiar da ampla e permanente companhia da nobreza, 

principalmente dos estratos mais elitistas, dava ensejo ao desenvolvimento 

dos laços entre o soberano e os seus interlocutores de eleição, bem como, 

não tão inocentemente, à subordinação e à fiscalização dos últimos. Por 

acréscimo, o desenvolvimento de uma nobreza cortesã reflectia-se, 

positivamente, numa imagem de poder e prestígio difundida para o resto do 

Reino e para o exterior, propiciava o recurso corrente ao conselho sobre 

amplas matérias e, em complemento, co-responsabilizava terceiros nas 

opções governativas do monarca. 

Norbert Elias assimilou esta relação incrementada a uma bem 

sucedida operação de manietação da nobreza pela Coroa, sem conseguir, 

porém, que a opinião gerasse consenso. A reflexão sobrevinda tem antes 

preferido apontar no sentido da conciliação de interesses mútuos, registando 

que se a confluência nobiliárquica em direcção à corte acarretou a perda de 

alguma autonomia, foi compensada pelas possibilidades de defesa mais 

aturada das conveniências próprias e de afirmação em relação a outras 

facções

156


. Enuncia-se inclusive a ocorrência de uma «domesticação»

157


 ou 

«dependência recíproca»

158

, mas a ideia que, porventura, resulta mais 



realista e feliz é aquela que concebe a corte como uma plataforma de 

aproximação entre a Coroa e a nobreza

159



Em consonância com a presença do monarca, o esteio principal da 



importância e da centralidade da corte  residia na atribuição de mercês e 

privilégios de que o dito conservava  o monopólio, atitude que, em boa 

medida, caracterizava a sua acção, lhe justificava o estatuto de supremacia 

sócio-política e concitava a atracção nobiliárquica. Deste ponto de vista, a 

presença assídua junto do soberano

160


 e a acumulação de benefícios 

                                                 

156

 Cf. Ronald G. Asch, «Introduction…», in Princes…, ed. Ronald G. Asch & Adolf M. Birke, 



p. 3. 

157


 Cf. Philippe Contamine, «L’État…», in L’État…, ed. Ph. Contamine, p. 20. 

158


 Cf. Rita Costa Gomes, «A Curialização...», in  O Tempo..., dir. Diogo Ramada Curto, p. 

180.   


159

 Cf. José Martínez Millán, «La Historiografia...», in  La Corte…, dir. J. M. Millán, vol. I, pp. 

37 e 39.   

160


 Nos casos em que a distância física era imposta pelo exercício de comissões de serviço 

periférico ou externo, constituía alternativa a capacidade de persuasão por via escrita, tanto 

melhor se reforçada por intermediários com acesso facilitado ao rei. Veja-se  infra capítulos 

2.2. e 2.3.  



Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

  61 


 

afiguravam-se indicadores fiáveis da boa disposição régia em relação a 

determinados fidalgos e linhagens, a qual decorria de alinhamentos 

convergentes e de apreciados desempenhos de serviço, prestando-se 

inclusive à aferição de uma hierarquia nobiliárquica de natureza informal e 

sujeita a flutuação conjuntural. 

 

Em Portugal, a afirmação inequívoca da corte esboçou-se, igualmente, 



a partir da Baixa Idade Média, sendo denunciada pela complexificação do 

sistema burocrático, pela valorização dos organismos e dos oficiais sob 

dependência directa da Coroa e pela tendência seguida pelas famílias nobres 

de estreitarem a ligação física ao espaço áulico, a ponto de se registar uma 

renovação dos estratos nobiliárquicos, condicionada pela emergência de uma 

nobreza palatina, dedicada ao serviço real e passível de distinção em relação 

à nobreza tradicional

161


 

A singularidade da ascendência dos  Sousas Chichorro permitiu-lhes 



realizar uma fusão espontânea das duas categorias. Ancorados na 

antiguidade e no prestígio da nobreza que lhes corria no sangue, não 

deixaram de capitalizar os benefícios resultantes da sua íntima associação ao 

meio cortesão. Daí que tenha sido possível a Rita Costa Gomes detectar, 

com relativa facilidade, a acumulação de experiência palatina dos mesmos 

entre os reinados de D. Pedro I e D. Afonso V

162

. O facto é merecedor de 



especial menção se forem tidas em linha de conta as sucessivas e graves 

conturbações que marcaram a evolução do Reino naquele período. Significa 

isto que a um direito inato de assistência na corte, usufruído pelos  Sousas 

Chichorro, esteve associada habilidade política suficiente para, em tempo útil, 

perceber quais eram os pólos de poder em emergência e acompanhá-los na 

perseguição dos respectivos desígnios. Como foi, argutamente, salientado 

por Armindo de Sousa, «não foi fácil às estirpes sobrenadar as vicissitudes 

várias do século. Ser linhagem ilustre e manter-se demandou muita 

prudência, discrição e táctica.»

163


.  

                                                 

161

 Cf. Rita Costa Gomes, «A Curialização...», in  O Tempo..., dir. Diogo Ramada Curto, pp. 



180-183; José Mattoso, «A Nobreza e a Revolução de 1383», in  Jornadas de História 

Medieval. 1383/1385 e a Crise Geral dos Séculos XIV-XV, Lisboa, s.n., 1985, pp. 391-402; e 

Mafalda Soares da Cunha, «A Nobreza...», pp. 220-221.    

162

 Cf. Rita Costa Gomes, A Corte…, pp. 65-66. 



163

 Cf. Armindo de Sousa, «A Socialidade...», in História de Portugal, dir. José Mattoso, vol. II, 

coord. José Mattoso, p. 443.  


Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

62 



 

 

A memória dessas épocas cruciais foi, diligentemente, avivada logo a 



partir das primeiras décadas de Quatrocentos. As penas de Fernão Lopes, de 

Gomes Eanes de Zurara e de Rui de Pina foram empunhadas com esse fim 

em vista, dando origem a um conjunto de crónicas régias e nobiliárquicas que 

celebravam tanto as iniciativas da dinastia  de Avis como o empenho das 

linhagens do Reino em secundá-las. Dos  autores citados, foi Zurara aquele 

que mais se prestou à lembrança e ao enaltecimento das façanhas cometidas 

pelos fidalgos, numa  atitude fundamentada  no desejo  de os premiar com  o 

reconhecimento público e  a  manifestação da graça do rei

164

. É certo que, 



apesar de compostos numa época contemporânea à da difusão da impressão 

na Europa, os textos em apreço permaneceram duradouramente em suporte 

manuscrito.  A circunstância, em si mesma  indicadora  do prestígio que lhes 

era votado,  mormente por comparação com os incunábulos, não implicava 

falta de divulgação, visto estar bem atestada a disponibilidade de cópias na 

Livraria Real e nas bibliotecas dos círculos elitistas

165

. Aliás, entre estes,  a 



leitura seria ávida e dotada de grande sensibilidade crítica, como se infere da 

reacção negativa que  a  primeira versão da  Crónica do Felícissimo Rei D. 



Manuel causou em diversas personalidades, em particular nos chefes das 

Casas de Tentúgal e de Bragança,  relativamente a factos antigos que tinham 

envolvido os  respectivos ascendentes. Pressionado pelo coro de censuras, 

Damião de Góis  viu-se compelido a introduzir várias alterações no texto, 

antes de ser dado à estampa em 1566

166


 

A um fidalgo adolescente, dedicado à leitura e curioso dos feitos das 



armas, como se supõe tenha sido Martim Afonso de Sousa

167


, ou a qualquer 

outro membro da sua linhagem minimamente curioso em complementar a 

memória oral difundida no seio do grupo,  não  teriam, pois, levantado 

dificuldades exageradas os desejos de aprofundar conhecimentos sobre a 

história do Reino e aquilatar o papel nela desempenhado pelos 

antepassados. Numa atitude mais  perfeccionista, poderiam ser buscadas 

                                                 

164


 Cf. António José Saraiva, s.v. «Zurara, Gomes Eanes de», in  Dicionário de História de 

Portugal, vol. VI, p. 359.   

165


 Cf. Ana Isabel Buescu, «A Persistência da Cultura Manuscrita em Portugal nos Séculos 

XVI e XVII», in  Ler História, nº 45, Lisboa, 2003, pp. 19-48. Para um inventário cronológico 

das publicações das crónicas portuguesas veja-se Idem,  Memória e Poder. Ensaios de 

História Cultural (Séculos XV-XVIII), Lisboa, Cosmos, 2000, p. 46.  

166


 Cf. David lopes, «Intodução», in Crónica, pp. xviii-xxxviiii 

167


 Assunto em desenvolvimento infra neste capítulo. 

Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

  63 


 

informações adicionais nos próprios arquivos familiares ou da Chancelaria 

Régia. Uma vez coligidos os dados  disponíveis e conduzida alguma reflexão 

em torno deles, encontrar-se-ia sempre plena justificação para o acesso fácil 

à corte e ao monarca de que os  Sousas Chichorro continuavam a gozar 

durante o reinado de D. Manuel I. 

 

 Importaria, no entanto, considerar ainda como relevante factor de 



análise e de valorização da linhagem o grau de intimidade pessoal partilhado 

com a figura régia. É provável que tenha sido elevado aquele que uniu Martim 

Afonso Chichorro ao primo coirmão e herdeiro da Coroa, futuro D. Afonso IV, 

a ajuizar pela sua adesão à revolta encabeçada pelo infante, visando minar a 

autoridade de D. Dinis

168


Igual sentimento de profunda confiança, arrastado pelo parentesco e 

pela partilha da mesma geração, teria marcado a relação entre Vasco Martins 

de Sousa e o infante D. Pedro, a ponto de este ter servido de fiador no âmbito 

da concertação matrimonial do primo com D. Inês Dias Manuel

169


. Nada de 

concreto se sabe a respeito da posição assumida por Vasco Martins durante 

a insurreição que o  Justiceiro levantou contra D. Afonso IV, após o 

assassinato de que foi vítima a Castro. Neste contexto, o seu aparecimento 

como chanceler-mor em 1357, logo nos primórdios do governo de D. Pedro, a 

par da obtenção simultânea de doações  régias

170

, deve ser entendido como 



retribuição da irrepreensível lealdade que teria evidenciado continuadamente 

e não como um mero corolário de carreira, destinado a premiar eventuais 

capacidades de organização burocrática.  

 

A ligação de Vasco Martins de Sousa a D. Fernando parece ter sido de 



natureza mais irregular e esbatida

171


, mas o valor e a autoridade do rico-

homem não foram negligenciados pela causa de Avis. Desconhecendo-se 

desde quando passou a pactuar com ela, é segura a sua presença e a do 

filho , Martim Afonso de Sousa, nas Cortes de Coimbra de 1385, em cujo 

                                                 

168


 Confirmação documental citada por José Augusto de Sotto Mayor Pizarro,  Linhagens 

Medievais Portuguesas. Genealogias e Estratégias (1279-1325), vol. I, Porto, Centro de 

Estudos de Genealogia, Heráldica e História da Família da Universidade Moderna, 1999, p. 

176. 

169


 Cf.  supra Parte I, nota nº 40. A este propósito, leiam-se os comentários de Bernardo 

Vasconcelos e Sousa, D. Afonso IV (1291-1357), s.l., Círculo de Leitores, 2005, p. 122.  

170

 Cf. supra Parte I, nota nº 69 e p. 45. 



171

 Cf. Luiz de Mello Vaz de São Payo, «A Família...», tomo  VI, pp. 377-378 e Rita Costa 

Gomes, A Corte..., p. 65.  


Martim Afonso de Sousa e a Sua Linhagem – Parte I 

 

64 



 

rescaldo ambos foram  elevados à categoria de membros do Conselho 

Real

172


Durante a referida reunião, reservou o Dr. João das Regras a Vasco 

Martins de Sousa uma especial responsabilidade na legitimação dos 

argumentos esgrimidos para abrir caminho à coroação do Mestre de Avis. Fê-

lo na medida em que Vasco Martins se perfilava como uma testemunha 

privilegiada da evolução política e social do Reino, nas últimas quatro 

décadas, é certo que para o bem da nova dinastia, mas também para o mal. 

Foi, pois, conveniente a omissão de ter sido ele um dos primeiros dignitários 

a receber a comunicação de D. Pedro I sobre o casamento que o teria unido 

a D. Inês de Castro e a recolher depois as declarações do celebrante e de um 

criado do rei, no quadro da averiguação conduzida a propósito e da qual 

saíram reforçados os estatutos dos varões nascidos daquela relação

173

. Em 


contrapartida, foi sublinhada a circunstância de Vasco Martins ter tido acesso 

à dispensa de parentesco emitida pela cúria romana para autorizar o 

matrimónio entre D. Leonor Teles e João Lourenço da Cunha, documento 

que, em última análise, constituiria prova definitiva do carácter adulterino do 

consórcio da mesma com D. Fernando, consumado em vida do primeiro 

marido, e da subsequente bastardia de D. Beatriz, filha única do casal e 

consorte do rei de Castela

174


. Por fim, a credibilidade do bisneto de D. Afonso 

III foi aduzida para refutar as pretensões de poder alimentadas pelos filhos da 

Castro, corroborando a ideia de que a parceria político-militar que tinham 

estabelecido com Henrique II de Castela, contra o rei D. Fernando, lhes 

custara, automaticamente, a perda da nacionalidade portuguesa

175


.  

Ao filho de Vasco Martins de Sousa coube a incumbência de arreigar a 

fidelidade hipotecada a D. João I num plano menos teórico, empunhando 

armas na batalha de Aljubarrota

176

. Trinta anos  volvidos, seria a vez dos 


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