Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
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History…, eds. Fátima da Silva Gracias, Celsa Pint o & Charles Borges, p. 105; Sanjay Subrahmanyam, A Carreira..., p. 357; João Paulo Oliveira e Costa, «A Estrutura de Comando do Estado da Índia durante o Governo de D. Henrique de Meneses», in D. João III e o
Malogrado...», p. 523, n. 488; e Andreia Martins de Carvalho, Nuno da Cunha..., pp. 65-66, 70- 71, 130. 180
«V. A. ouve por seu servyço qu’eu fose à Yndya por mays rezões que lhe eu dey pera [não] amdar debayxo de Nuno da Cunha, e com regymento seu e cos poderes que m’ele dise. [...] Todos estoutros que lá tyveram este carrego que eu levo eram omens que a Ymdya fez, e que os capitães-mores dela davam este carrego por serem seus parentes e lhes estar muy bem ser tudo por sua mão deles.» - cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, ao largo da costa da Guiné, 12.IV.1534, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J., p. 8. 181 Diogo do Couto foi o único cronista a admitir que «o Governador se pejou com Martim Affonso de Sousa por vir provido daquelle cargo» - cf. Ásia, IV, ix, 1. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
179 contacto entre os dois oficiais 182
, mas o desenvolvimento do mesmo foi minado, de raiz, pela desconfiança mútua, pela clara ambição de Martim Afonso de Sousa em aceder ao topo da hierarquia do Estado da Índia 183
e pelo ressentimento nutrido por Nuno da Cunha, em vista das relevantes vitórias que o capitão-mor do mar foi acumulando.
Os reflexos mais nítidos e virulentos daquela incompatibilidade encontram-se no conjunto epistolar redigido por Martim Afonso de Sousa de 1534 a 1538. Da respectiva leitura emergem como traços distintivos da personalidade do fidalgo a presunção, a apetência pela fortuna e pelo poder, a frontalidade e a emotividade. Simultaneamente, percebe-se a existência de uma forte unidade temática, girando em torno de uma campanha de auto- promoção, baseada ora no elogio ora na comiseração pessoal; da activação das ligações privilegiadas que mantinha com D. João III e D. António de Ataíde; e da avaliação das condições da presença portuguesa no Subcontinente, invariavelmente acompanhada de severas críticas ao desempenho de Nuno da Cunha
184 . Tais características estimularam Martim Afonso para uma acção político-militar diligente, de resultados positivos imediatos e contrastantes com os do governador, os quais lhe reforçaram os argumentos da oposição e deram um contributo decisivo para a assimilação da década de 1530 a uma conjuntura de sucesso global vivida pelo Império Português 185 .
Em obediência às prioridades gizadas pela Coroa, o problema da instalação portuguesa no Guzerate foi o primeiro a cuja resolução se votou o capitão-mor do mar 186
. Aquando da sua chegada a Goa estavam em curso preparativos para fazer avançar uma armada para aquela região, com o objectivo de relançar as hostilidades. Martim Afonso foi prestes a tomar conta
182 Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Cochim, 24.XII.1536, pub. in Martim Afonso de Sousa, dir. Luís de Albuquerque, p. 40. 183
Assunto a ser desenvolvido ao longo deste capítulo. 184
Entre muitas outras linhas eivadas de espírito depreciativo, as seguintes estarão entre as mais eloquentes: «os que vão neste navio não vos hão-de falar muito em mim porque lhes tapou Nuno da Cunha as bocas; cumpre que Vossa Senhoria olhe as novas da maneira que já [escrevi], porque eu vos juro aos santos Evangelhos que passa pontualmente como escrevo, de que saltou tão grande a raiva a Nuno da Cunha que me beberia o sangue se pudesse» - cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, Lâthi [Kâthiâwar], 1.XI.1535, pub. in Martim Afonso de Sousa, dir. Luís de Albuquerque, p. 31. 185
Cf. João Paulo Oliveira e Costa, «A Política Expansionista...», pp. 24-27. 186
Sobre a evolução da relação luso-guzerate, na década de 1530, reporto-me largamente ao artigo de Muzafffar Alam & Sanjay Subrahmanyam, «Letters from a Sinking Sultan», in Aquém e Além da Taprobana..., ed. Luís Filipe Thomaz, pp. 239-269. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
180 das operações, dirigindo-se para Damão, que assediou e dominou, sem proceder à ocupação do espaço 187 , dali inflectindo rumo a Diu, movido por igual intuito bélico. A repetição do confronto foi, no entanto, evitada graças a uma iniciativa diplomática do sultão guzerate, Bahadur Shah, que se dispôs a abdicar da autoridade que exercia sobre Baçaim e a cedeu, de facto, ao Estado da Índia, ainda no curso de 1534 188 .
por Martim Afonso, mas não era de todo alheio às apreciáveis mutações geo- políticas que se vinham desenhando na zona setentrional da Índia. Não obstante a maioria da população local ser hindu, o exercício do poder caíra em mãos muçulmanas, mercê de uma série de invasões, perpetradas a partir do século XI, com origem na Ásia Central e no planalto iraniano. Daí resultara a fundação do sultanato de Deli, em 1193, cuja área de influência cobriu a generalidade da planície indo-gangética, até aos finais do primeiro quartel do século XIV. O sultanato de Deli sobreviveu para além daquela época, embora penalizado por um processo de fragmentação territorial, do qual surgiram novos estados muçulmanos, de que foi exemplo o sultanato do Guzerate, em 1396. O cenário fragmentado, conjugado com a riqueza da Índia, serviu de chamariz a Babur, um líder muçulmano turco-chagatai, que tinha senhoreado Cabul, em 1504, e Kandahar, em 1522, ganhando assim acesso privilegiado ao Subcontinente através da vizinha portela de Khaiber. Babur subjugou e suprimiu, em definitivo, o sultanato de Deli em 1526, empregando os quatro anos que lhe restaram de vida nas tarefas de ampliação e de consolidação do nascente Império Mogol 189
. Como era frequente no mundo islâmico, falho, desde sempre, de regras de sucessão precisas e incontestadas, Humayum, o
187
«Cá me fez Deos huma grande mercê na tomada duma fortaleza. Eu sey bem que V. S. á de ter dyso tamto contentamento como eu. Foy muy gram dyta porque, alem da cousa em sy ser grande e muy omrada, foy logo no pryncypio e gemte fycou cremdo em my, e ganhar no começo boa fama é gram negocyo» - cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, na barra de Diu, 15.XI.1534, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J., p. 16. Pormenores da ofensiva encontram-se descritos, na primeira pessoa, in Martim Afonso de Sousa, «Brevíssima e Sumária Relação...», p. 70. 188
Veja-se Dejanirah Couto, «Em Torno da Concessão e da Fortaleza de Baçaim (1529- 1546)», in Mare Liberum, nº 9, Lisboa, CNCDP, 1995, p. 119. 189 Do termo persa mughal que significa mongol. Importa, por isso, não confundir os Impérios Mongol e Mogol, correspondentes a diferentes realidades geográficas e cronológicas, ainda que o segundo recolhesse no primeiro as suas remotas origens. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
181 novo padshah 190
entronizado em 1530, teve de enfrentar a rivalidade dos irmãos, acrescida da reacção adversa de forças centrífugas indianas. A implantação recente do poder mogol e o carácter infirmado do mesmo tornavam a ocasião propícia a medições de forças, apresentando-se o sultão do Guzerate como um dos desafiantes. Em busca de um estatuto de preponderância, Bahadur Shah investiu vitoriosamente contra o sultanato de Malwa, em 1531, e contra o Mewar, um dos mais importantes estados rajput 191
, em 1533. Encurtou, desta sorte, a distância que o separava de Deli e de Agra, as duas principais cidades da planície indo-gangética, sob jurisdição mogol, e tornou previsível a decisão de uma intervenção militar por parte de Humayum 192
. Debaixo de mira dos ataques navais portugueses e dos ataques terrestres mogóis, Bahadur Shah resolveu abrir mão de Baçaim a fim de aliviar uma das frentes de pressão. A intensidade da ofensiva que Humayum fez abater sobre as hostes guzerates estacionadas no Rajastão forçou, todavia, a sucessivas retiradas do sultão, que se acolheu a Diu nos meados de 1535. A delicadeza da situação sugeriu-lhe a obtenção de apoios externos, os quais foram procurados, com pragmatismo, tanto junto dos irmãos de fé otomanos como dos rivais portugueses, acenando neste caso com a cedência de Diu. O auxílio determinado a partir de Istambul seria sempre moroso, pelo que coube às autoridades do Estado da Índia ajuizar sobre o lançamento de uma tábua de socorro da qual Bahadur Shah se pudesse valer em tempo útil. Nuno da Cunha e Martim Afonso de Sousa convergiram, naturalmente, quanto à receptividade merecida pela proposta guzerate, mas fizeram cessar aí qualquer espírito de concertação. O antagonismo que nutriam um pelo outro empurrou-os para uma competição em torno do desfecho da questão de Diu. Achando-se em Goa, o governador tentou conduzir o processo através de interposta pessoa, o fiel secretário Simão Ferreira 193 , e apoiou-se no parecer 190
Título persa adoptado pela realeza mogol. 191
Bastiões políticos hindus sobreviventes no Norte da Índia, concretamente, no território do Rajastão, que funcionava como espaço tampão entre o Guzerate e o coração político, primeiro, do sultanato de Deli, e, depois, do Império Mogol. 192
Cf. Marc Gaborieau, «Les Nouveaux Venus», in Histoire de l’Inde Moderne 1480-1950, dir. Claude Markovits, Paris, Fayard, 1994, pp. 85-88 e Gordon Johnson (dir.), The New Cambridge History of India, vol. 1.5., The Mughal Empire, John F. Richards, Nova Deli, Cambridge University Press-Foundation Books, 1994, pp. 6-10. 193 Cf. Andreia Martins de Carvalho, Nuno da Cunha..., p. 70. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
182 da maioria do Conselho para ve tar a ida Martim Afonso a Diu 194
. Viu-se, no entanto, literalmente ultrapassado pelo capitão-mor do mar, o qual, estando posicionado com a armada defronte a Chaul, nos princípios de Setembro de 1535, tratou de seguir naquela direcção, sem grandes delongas. Em Diu, Martim Afonso partilhou com Simão Ferreira as despesas da representação oficial portuguesa durante as rondas negociais, que se concluíram pela autorização da edificação de uma fortaleza portuguesa, em troca de ajuda militar, salvaguardando-se quanto ao resto a manutenção da soberania guzerate sobre a cidade. Após duas décadas de esforços infrutíferos, em cerca de um ano de serviço, Martim Afonso de Sousa justificara o voto de confiança das autoridades do Reino, facultando ao Estado da Índia a tutela sobre dois entrepostos no Guzerate. Tinha, portanto, fundamento a manifestação de prosápia que deixou implícita quando comunicou a D. João III que o seu «modo de negociar não pareceu bem a Nuno da Cunha, porque era chegado a conclusão que parece que não é de sua condição, porque é mais vagaroso do que para estes mouros é necessário, que não querem outra coisa que alargarem-lhe a trela a negócio; e com isto passou ele cá alguns verões que o trouxeram enganado, e no cabo deles, tornava-se com a cara ou cana ao posto sem fazer mais senão muito gasto com a armada que levava e gastar muito tempo em capitulações com el-Rei de Cambaia». 195
. A aposta de Martim Afonso em relegar o governador para um papel inferior teve máxima expressão no zelo que teve em obter do sultão a promessa de que lhe seria conferida a honra de hastear o pavilhão com as armas reais portuguesas, no local destinado à fortaleza, para contemplação amargurada de Nuno da Cunha quando, finalmente, aportou a Diu, em Outubro de 1535 196
.
194 Cf. João de Barros, Ásia, IV, vi, x e História, VIII, xcvii. 195 Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Lâthi [Kâthiâwar], 1.XI.1535, pub. in Martim Afonso de Sousa, dir. Luís de Albuquerque, p. 26. Alguns passos à frente, acrescentou «tenho eu muito gosto e parece-me que é muito merecimento ante Vossa Alteza de ser eu o meio por onde Deus faz esta mercê a Vossa Alteza, que certo é muito grande, assim para segurança do que tendes na Índia, como para crédito de todos os portugueses, que é coisa mui necessária nesta terra, porque não iam a parte onde lhes não dessem em rosto com Diu – cf.
196
«E quando o governador veio, assim o achou embandeirado o principal baluarte que logo entregaram, e eu hei por mui grande dita e grande boa ventura ser eu o primeiro homem que arvorei bandeira de Vossa Alteza dentro de Diu». – cf. Ibidem, pp. 27-28.
Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
183 A imagem de eficiência construída e difundida pelo capitão-mor do mar da Índia cativou inclusive Bahadur Shah, que insistiu na incorporação dele à cabeça do destacamento português que deveria conjugar esforços com as forças guzerates na guerra contra os Mogóis 197 . Martim Afonso de Sousa acedeu porquanto adquirira noção da prioridade com que merecia ser equacionada a relação luso-guzerate, no quadro geral da diplomacia do Estado da Índia. O pomo da questão não se circunscrevia à importância de respeitar as cláusulas do acordo celebrado com o sultão e de, por essa via, assegurar a continuidade da presença portuguesa em Diu. Tratava-se de alargar horizontes e de fazer perceber às altas instâncias nacionais que a sustentação de Bahadur Shah podia servir, em última análise, a segurança do próprio Estado da Índia. A clarividência do capitão-mor do mar levou-o a prevenir que, uma vez «ele perdido, não têm com quem entender os mogores senão connosco, e são muito piores inimigos do que nunca cá tivemos, porque esta é outra gente que não já a da Índia, e isto se entende cá mui mal» 198
. Talvez Martim Afonso fosse desconhecedor dos sérios problemas que a nobreza afegã fixada no Nordeste indiano já estava então a impor à liderança de Humayum, os quais acabariam por lhe acarretar um interregno no exercício do poder e uma experiência de exílio, entre 1539 e 1555 199
. O facto é que, sob a égide dos sucessores daquele, entre os meados de Quinhentos e os primórdios de Setecentos, o Império Mogol logrou afirmar-se como a segunda entidade hegemónica da história do Subcontinente, depois do apogeu vivido pelo Império Maurya, no século III a.c., e antecedendo o Raj britânico, que despontou em finais do século XVIII e tomou forma definitiva em finais da década de 1850. A partir da segunda metade da centúria quinhentista, os Mogóis acabaram, pois, por ser percepcionados pelos dirigentes do Estado da Índia como uma ameaça latente, a exigir vigilância constante e manobras de
197 Cf. Ibidem, pp. 28-29. 198 Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Lâthi [Kâthiâwar], 1.XI.1535, pub. in Martim Afonso de Sousa, dir. Luís de Albuquerque, p. 29. 199
Veja-se Marc Gaborieau, «Les Nouveaux Venus», in Histoire de l’Inde Moderne…, dir. Claude Markovits, pp. 88-91 e Gordon Johnson (dir.), The New Cambridge History of India, vol. 1.5., The Mughal Empire, John F. Richards, pp. 10-12
Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
184 envolvimento 200
, ficando confirmada, a posteriori, a validade da análise política de Martim Afonso de Sousa. A campanha militar luso-guzerate teve curta duração 201
e, por manifesta debilidade do exército de Bahadur Shah, não foi marcada pela ocorrência de recontros decisivos 202
. O prestígio de Martim Afonso como conselheiro militar e a admiração que lhe dedicava o sultão permaneciam, todavia, intactos quando retornou a Diu, onde se deteve durante o primeiro trimestre de 1536, acompanhando o levantamento da fortaleza portuguesa 203 . Concluída a obra e instalados os primos Manuel de Sousa, no governo da praça 204
, e Leonel de Sousa de Lima, na capitania do baluarte do mar 205 , o capitão-mor do mar foi invernar a Goa 206
, tardando pouco tempo até que os seus préstimos fossem reclamados noutra área sensível para os interesses do Estado da Índia.
200
Veja-se Jorge Manuel Flores, Firangistãn e Hindustãn: o Estado da Índia e os confins Meridionais do Império Mogol (1572-1636), Lisboa, FCSH-UNL, 2004, dissertação de doutoramento em suporte electrónico. 201 Iniciada em fins de Outubro de 1535, cessou em data incerta do mês seguinte ou já nos princípios de Dezembro – cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. João III, Lâthi [Kâthiâwar], 1.XI.1535, pub. in Martim Afonso de Sousa, dir. Luís de Albuquerque, p. 30 e carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, Diu, 12.XII.1535, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J., p. 22. 202 Sobre as peripécias da expedição vejam-se carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, Diu, 12.XII.1535, pub. in Ibidem, p. 22; João de Barros, Ásia, IV, vi, 16; Diogo do Couto, Ásia, IV, ix, 19, Lendas, vol. III, pp. 652-660, 670-671; e História, VIII, cx. 203 Cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, Diu, 12.XII.1535, pub. in Cartas..., ed. Georg Schurhammer S.J., p. 22. Nuno da Cunha apenas abandonou Diu em finais de Março, sendo improvável que Martim Afonso de Sousa o tivesse feito com antecedência – cf. João de Barros, Ásia, IV, vi, 17 e Lendas, vol. III, p. 689. 204
Cf. João de Barros, Ásia, IV, vi, 15; Diogo do Couto, Ásia, IV, x, 5; História, VIII, cxxiiii e Lendas, vol. III, pp. 687-688. A escolha do primo de Martim Afonso de Sousa pode ser entendida à luz de diversos condicionalismos. Desde logo, a circunstância de Manuel de Sousa ter vindo a acalentar a esperança de alcançar a capitania de Diu, em articulação com a “dívida” que Nuno da Cunha contraíra junto dele, a propósito da abdicação da capitania-mor do mar de Ormuz – veja-se supra Parte II, nota nº 66. O governador não se escusou a saldá-la, para despeito de alguns veteranos, pois, como lembrou Gaspar Correia, Manuel de Sousa era «homem assás fidalgo, mas um pouqo mancebo, que nom chegaua a corenta annos de sua idade, de que a gente ficou muito desgostosa». Cumpre ainda assinalar que Diogo do Couto não menosprezou a influência que deve ter sido jogada pelo parentesco que unia o indigitado a D. António de Ataíde. Por fim, Martim Afonso de Sousa era da opinião que a nomeação em causa era uma questão de reconhecimento de mérito e não de pura mercê, uma vez que Manuel de Sousa seria o único fidalgo a reunir todos os predicados exigidos pelo exercício do cargo – cf. carta de Martim Afonso de Sousa a D. António de Ataíde, Diu, 12.XII.1535, pub. in
se, sem invalidar as restantes motivações, que Nuno da Cunha também foi levado a escolher Manuel de Sousa para não acicatar a relação tensa que já mantinha com o capitão-mor do mar.
205 Cf. Lendas, vol. III, p. 687. Leonel de Sousa de Lima era terceiro primo de Martim Afonso e irmão de João de Sousa de Lima – Veja-se o Anexo Genealógico nº V. 206
Cf. Ibidem, vol. III, pp. 693 e 699. Martim Afonso de Sousa e a Susa Linhagem – Parte II
185 Na origem do problema esteve o Samorim de Calecut. Apostado em restaurar a antiga supremacia do seu reino sobre os restantes vizinhos da costa do Malabar, concebeu ele, como primeiro passo a dar nesse sentido, a realização de uma cerimónia especial de entronização, a qual lhe aportaria uma legitimidade superior, de cariz imperial, por decorrer sobre uma antiga pedra sagrada, tradicionalmente usada para tal efeito. Achava-se a dita pedra nas terras de Repelim, cujo acesso obrigou o Samorim a tentar forçar a passagem pelos domínios do adversário rajá de Cochim. Enquanto entidade aliada do segundo e desejosa de evitar que o reacendimento do conflito entre os principais reinos do Malabar pudesse evoluir a ponto de perturbar o tráfico pimenteiro 207
, o Estado da Índia não pôde remeter-se a uma atitude distraída. Daí que, no mês de Setembro de 1536, tendo chegado ao fim a época da monção, Martim Afonso de Sousa tivesse conduzido a sua armada para a Download 3.56 Mb. Do'stlaringiz bilan baham: |
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